sexta-feira, 30 de agosto de 2013

A VIDA NOS MUNDOS INVISÍVEIS -BLOCO VII

II.  O Solo

Para se ter uma idéia adequada do solo sobre o qual caminhamos, e no qual se erguem nossas casas e edifícios, precisam-se varrer da mente todas as concepções mundanas. Em primeiro lugar, não temos estradas como são conhecidas na terra. Temos largas ruas em nossas cidades, mas não são pavimentadas com substância composta que lhes dê dureza e durabilidade para suportar o movimento constante de trá­fego. Não temos trânsito, e nossas estradas são cobertas da mais espessa grama, tão macia ao pisar como um canteiro de musgo fresco. É nesse tapete que caminhamos. A grama nunca vai além do estabelecido para uma boa ornamentação e no entanto ela continua viva. Mantém-se-sempre no mesmo nível prático, perfeita para caminhar e perfeita na aparência.
Nos lugares em que caminhos menores são necessários, e onde a grama não seria adequada, vê-se então a pavimentação costumeira do mundo terreno, mas de material diferente. Pode-se dizer que é de pedra, sem, porém, a característica cor cinza opaca. Parece muito com alabastro, de que a maioria dos prédios são construídos. As cores variam, mas todas possuem delicados tons pastel.
Como sobre a grama, é muito agradável andar sobre a pedra, embora, naturalmente, não seja esta tão macia. Mas existe aí certa propriedade, certa elasticidade, se assim podemos dizer, algo como a consistência mole de algumas madeiras terrenas utilizadas para os assoalhos. Esta é a única maneira de dar uma idéia sobre a diferença entre a pedra terrena e a pedra espiritual.
Não há, é claro, qualquer descoloração feia na superfície dos calçamentos. Conservam sempre sua beleza inicial. Muitas vezes os pavimentos revelam um emaranhado de mag­níficos desenhos formados pelo uso de diferentes materiais coloridos e que combinam harmoniosamente com o ambiente.
Ao aproximarmo-nos dos limites dos reinos superiores, o chão se torna mais translúcido e parece perder a aparência sólida, apesar de continuar a ser sólido ainda. Mas ao apro­ximarmo-nos dos reinos inferiores, os pavimentos tornam-se de aparência pesada, começam a perder a antiga cor até ficarem opacos e plúmbeos, e parecem-nos de extrema so­lidez, quase como o granito terreno.
À volta de nossas casas temos gramados e árvores entre­meados de caminhos de pedra, semelhante à que acabei de descrever. Terra nua, porém, vê-se muito pouco ou nenhuma.

Na verdade não me lembro de ter visto algum terreno baldio, porque aqui não desleixo, indiferença ou indolência.
Quando ganhamos o direito de possuir nosso lar espiritual, passamos a ter também dentro de nós o constante desejo de manter e melhorar sua beleza. E isso não é muito difícil de realizar visto que a beleza responde e floresce de acordo com a apreciação que se faz dela. Quanto mais atenção e reconhecimento lhe dermos maior será sua resposta; a beleza espiritual não é abstrata mas uma força real e viva.

 A vista de meu lar é de campos verdejantes, casas encan­tadoras situadas entre aprazíveis bosques e jardins, e com uma vista longínqua da cidade. Mas em parte alguma se vêem terras áridas ou nuas. Cada polegada que se é cuida­da, de maneira que a paisagem toda é um deslumbramento de cor, desde o brilhante verde-esmeralda da grama, até as multicoloridas flores dos jardins, coroando todo o azul ce­lestial acima de nós.
Perguntamo-nos de que é composto o solo no qual as flores e árvores estão crescendo é alguma espécie diferente de terra? O solo existe, é claro, mas não tem o mesmo conteúdo mineral que constitui o solo terreno, porque é preciso compreender que a vida aqui deriva diretamente da Grande Fonte. O solo varia na côr e densidade em diferentes localidades da mesma maneira que na terra. Não a inves­tiguei pormenorizadamente, mas posso entretanto dar uma pequena idéia de sua aparência e características. Em pri­meiro lugar, ela é perfeitamente seca não pude achar ne­nhum traço de umidade. Descobri que escorre por entre os dedos da mesma maneira que a areia. Sua côr varia mas nunca se aproxima da pesada côr escura do solo terreno. Em alguns lugares é de formação granular mais fina, en­quanto noutros é mais grossa isto é, relativamente.
Uma das propriedades inesperadas deste solo é o fato que, embora possa correr macia e livremente pela mão, quando não tocado permanece inteiramente ligado, suportando tão firmemente quanto a terra comum tudo quanto é cultivado nela.

A côr da terra é governada pela côr da vida botânica que nutre. Mas aqui também não há especial significado, nem profunda razão simbólica para este estado de coisas. Simplesmente a côr do solo é complemento da côr das flores e árvores, e o resultado é, como não podia deixar de ser, de inspiradora harmonia.
Certamente que este mundo do espírito não é constituído de uma série de profundos e complexos mistérios, expli­cáveis apenas a alguns. Há mistérios, sim, como os há no plano terrestre. E assim como lá existem grandes cérebros que podem solver esses problemas, aqui também os há, e muito maiores, que podem dar explicações, desde que nossos intelectos estejam prontos para recebê-las e compreendê-las.
Mas muita gente na terra acredita sinceramente que nós no espírito vivemos em contínuo estado de fervorosa emoção religiosa, e que cada forma e grau de atividade pessoal, cada átomo de que é composto o grande mundo espiritual, deve ter algum significado devocional e piedoso. Tal idéia é tola e muito aquém da verdade. Procure através do mundo terreno: é capaz, de encontrar idéias assim tão absurdas ligadas à multiplicidade da vida que jaz dentro dele? Não há significado religioso num maravilhoso pôr do sol. Por que haveriam nossas flores espirituais de ter qualquer outra razão de existir senão a que eu já dei, isto é, um magnífico dom do nosso Pai, para nosso maior gozo e felicidade?
Há ainda muitos outros na terra que solenemente afirmam, como uma cláusula de fé, que o paraíso, como o chamam, será um contínuo cantar de hinos e cânticos espirituais. Nada seria mais fantástico. O mundo espiritual é um mundo de atividade, não de indolência, um mundo de utilidade e não um mundo inútil. Há sempre uma razão sã e um fim para tudo. Nem a razão nem o fim podem ser visíveis a todos desde o começo, mas isso não altera a verdade.
O tédio não tem lugar aqui. Miríades de tarefas a serem executadas — e miríades de almas para executá-las — mas há sempre lugar para mais uma, e será sempre assim. Não vivemos nós num inundo ilimitado?
Não vivemos num país que tem aparência de um Eterno Domingo! Na verdade, Domingo não tem lugar nem razão de ser neste plano de coisas. Não temos necessidade de sermos forçados a nos lembrar do Grande Pai do Universo, dedicando-lhe um dia especial e esquecendo-o o resto da semana. Não temos semana. Entre nós é dia eterno, e nossas mentes estão sempre inteiramente cônscias d'Êle, e podemos ver Sua mão e Sua mente em tudo que nos rodeia.
Desviei-me um pouco do que me propunha contar-lhes mas é imperativo dar ênfase a certos aspectos da minha narrativa, porque muitas almas na terra ficam chocadas ao saber que o mundo espiritual é um mundo sólido e substancial, com pessoas reais e vivas. Eles acham que é material demais, e tanto como o mundo terreno; na verdade está distante dele apenas um passo, com sua paisagem e sol espirituais, suas casas e edifícios, rios e lagos, e habitados por gente sensível, por seres inteligentes!
Esta não é a terra do descanso eterno. Há descanso bastante para aqueles que dele necessitam, mas quando o repouso lhes devolveu o vigor e saúde, volta-lhes o desejo de realizar algo de sensato e útil, e não faltam as oportuni­dades.
Mas voltemos às características do solo espiritual.
Ao aproximarmo-nos das regiões escuras, o solo, como descrevi, perde sua qualidade granular e sua côr. Torna-se espesso, pesado e úmido, até que finalmente dá lugar intei­ramente a pedras e depois a rochas. A pouca grama que existe é amarela e chamuscada.
Ao chegarmos perto dos reinos mais elevados as partículas do solo tornam-se mais finas, as cores mais delicadas, com aspecto translúcido. Maior grau de maciez é imediatamente observado debaixo de nossos pés, assim que nos aproximamos dos umbrais desses reinos.
Observada de perto, a terra revela qualidades de uma quase jóia, tanto em côr como em forma.    As partículas

nunca são mal formadas, mas observam um plano geométrico definido. Rute e eu mergulhamos nossas mãos no chão dei­xando que a terra escorresse por entre nossos dedos, em suave corrente. Ao cair produzia sons musicais dos mais doces, como se estivesse caindo sobre algum minúsculo instrumento mu­sical,  fazendo as teclas produzirem ondas sonoras.
Um ouvido apurado poderá captar muitos sons musicais nas praias terrestres, rio avançar e retroceder das ondas sobre a areia, mas não é necessário ouvido aguçado para ouvir essas ricas harmonias, f quando é o solo espiritual que as produz.
Os sons emitidos desta maneira variam tanto quanto as cores e os elementos que os produzem. Estão lá para serem ouvidos e podem ser produzidos por aquela simples ação que descrevi.
Como se realiza isso, direis vós?
Côr e som — isto é som musical — são termos inter--relacionados. Produzir côr é produzir também som musical. Executar um instrumento musical, ou cantar, é criar côr, e cada criação é governada e limitada pela habilidade e profi­ciência do instrumentista ou cantor.   Uma virtuose quando
toca seu instrumento está criando sobre si mesmo os mais lindos pensamentos-formas musicais, que variam em cores e matizes de sombra, de acordo com a música executada. Um cantor pode criar semelhante efeito em relação à pureza da voz e à qualidade da música. A forma-pensamento, por conseguinte, não é muito ampla. É uma forma em mi­niatura. Entretanto, uma grande orquestra ou um coral, podem construir uma imensa forma, governada, certamente, pela mesma lei.
A forma-pensamento musical não produz, em si, nenhum som. É o resultado de sons, e é, por assim dizer, uma unidade independente. Embora a música possa produzir a côr, e a côr possa produzir a música, cada uma delas está restringida a uma forma resultante. Não há uma alternância,

constante, interminável ou que diminua gradualmente, entre côr e som.
Não se deve imaginar que com a vasta galáxia de cores, das milhares de fontes no mundo espiritual, nossos ouvidos sejam constantemente assaltados por sons musicais; que vi­vamos, de fato, em uma eternidade de música soando e ressoando sem parar. Há poucas mentes — se as houver — que pudessem suportar tal pletora contínua de som por mais belo que fosse. Suspiraríamos por paz e sossego, nosso céu deixaria de ser céu. Não, a música existe, mas é inteira­mente da nossa vontade ouvi-la ou não. Podemos nos isolar completamente de todo som, ou nos abrir inteiramente aos sons, u ainda, ouvir apenas aquilo que nos apraz.
Há ocasiões na terra em que podemos ouvir acordes distantes de música sem sermos incomodados por eles; pelo contrário, achamo-los agradáveis e calmantes. Assim também é aqui no espírito. Mas há uma grande diferença entre os nossos dois mundos — nossas potencialidades para a música elevada são muito maiores do que a daqueles sobre a terra. A mente de uma pessoa espiritual cujo amor à música é profundo, ouvi-la-á naturalmente mais do que uma pessoa que não a aprecia.
Voltemos à experiência que eu e Rute fizemos com o olo. Ambos temos grande prazer em ouvir música, ela mais ainda do que eu, visto que foi educada para a arte musical e tem portanto um poder mais profundo de apreciar e com­preender a técnica musical. Como já disse, assim que o solo deixa nossos dedos podem-se ouvir encantadores sons emitidos por êle. Outra pessoa realizando a mesma ação, mas sem possuir a mesma susceptibilidade musical, mal ouviria qual­quer som. As flores, tudo que cresce, respondem imediata­mente àqueles que as amam e apreciam. A música que eles emitem existe precisamente sob a mesma lei.
Seria terrível imaginar que o mundo espiritual fosse um imenso pandemônio musical, continuando incessantemente,

inevitavelmente, e em todas as ocasiões, noras e lugares pos­síveis. Não! - o mundo espiritual é organizado em linhas melhores do que essas.
Há pessoas na terra que têm a habilidade de se isolar mentalmente de seu ambiente de tal maneira que podem se abstrair de todos os sons, por mais intensos.   Este estado de alheamento completo serve de analogia — um pouco ele­mentar — do efeito que podemos produzir em nós mesmos em espírito, com a exclusão de sons que não desejamos ouvir. Ao contrário do mundo terreno, não precisamos usar de grande força de concentração.   É apenas outro processo de pensar, assim como usamos nossas mentes para nos locomovermos, e depois de um breve estágio em espírito, cedo podemos rea­lizar essas variadas funções mentais sem qualquer esforço aparente.   São parte de nossa própria natureza e estamos apenas aplicando, sem as limitações e restrições da terra, métodos mentais simples de aplicar.   Na terra nossos corpos físicos, num pesado mundo físico, impediam similares pro­cessos mentais de produzir qualquer resultado físico.   No mundo espiritual somos livres, e essas ações mentais mostram um instantâneo e direto resultado, seja para nos movermos com a rapidez do pensamento, seja para nos abstrairmos de qualquer aspecto ou som que não desejamos experimentar.
Por outro lado, podemos — e o fazemos abrir nossas mentes e absorver os inúmeros sons maravilhosos que se erguem à nossa volta. Podemos abrir nossas mentes — ou fechá-las ~ aos muitos deleites que a natureza nos prodigaliza para nossa felicidade e contentamento. Eles agem sobre a mente como tônico, mas não nos são impostos: apenas os tomamos se desejarmos. Devemos ter em mente que as regiões espirituais são baseadas na lei e na ordem. Mas a lei nunca é opressiva nem cansativa, porque a mesma lei e ordem ajudam a prover as incontáveis belezas e maravilhas deste reino celestial.

III.  Métodos de Construção

ao menos importantes, entre as características físicas ao reino em que eu vivo, são os numerosos edifícios devotados ao processo de aprendizagem e fomentação das artes conhe-cidas no plano terrestre. Estes magníficos edifícios apre­sentam todos os sinais de eternidade. Os materiais de que são construídos são imperecíveis. As superfícies de pedra são tão limpas e frescas como no dia em que foram erguidas. Nada há para as poluir, nenhuma atmosfera carregada de fumaça para corroê-las, nem ventos e chuvas para desgastar as obras de decoração externa. Os materiais de que são feitos pertencem ao mundo espiritual e portanto têm uma beleza que não é terrena.
Apesar de essas esplêndidas mansões do saber terem toda a aparência de estabilidade, poderiam ser demolidas se fossem consideradas dispensáveis, e isso já tem acontecido. Alguns edifícios foram removidos e outros tomaram seu lugar.
O mundo espiritual não é estático. É sempre vibrante de vida e movimento. Contemplem, por um momento, as condições normais do mundo tererno, com as constantes mudanças que sempre ocorrem — a gradual reconstrução de cidades, a alteração do campo. Algumas dessas mudanças nem sempre foram consideradas melhoramentos. Contudo são feitas e o processo é estimado como progresso. Que dizer então do mundo espiritual? Não haverá mudanças no mundo em que vivo?   Certamente que sim!
Não "evoluímos com os tempos" propriamente — para usar uma frase da terra — porque estamos sempre muito adiante dos tempos. E precisamos estar, para fazer face às pesadas exigências impostas a nós pelo mundo terreno.
Tomemos um exemplo específico — apenas um.
Quando o mundo terreno progride em civilização os métodos de guerra tornam-se mais e mais devastadores e completos. Em lugar de centenas de mortos em batalhas
como nos velhos tempos, o morticínio agora é contado em
centenas de milhares. Cada uma dessas almas acabou com
a sua vida terrena, — mas não com as conseqüências dela
— e em muitos casos o mundo também acabou com elas.
O indivíduo pode sobreviver como uma memória para aqueles
que acabou de deixar; sua presença física foi-se. Mas sua
presença espiritual permanece inalterável entre nós. O mundo
terreno passou-o para nós, muitas vezes sem se importar com
o que lhe aconteceu. Êle deixará para traz aqueles que amou
e que o amaram, mas o mundo terreno nada pode fazer por
êle — assim pensam — nem por aqueles que o pranteiam.
Nós, no mundo espiritual, é que teremos que cuidar dessa
alma.           |

Entre nós não podemos alijar essa responsabilidade para outros ombros, pois aqui encaramos a estrita realidade.
O mundo em sua ignorância cega, atira centenas de milhares de almas ao nosso reino, mas aqueles que habitam as regiões superiores estão a par, bem antes de acontecer, do que ocorre no plano terrestre, e um fiat é ordenado aos mais próximos reinos da terra a fim de que se preparem para o que vai acontecer.
Essas calamidades do mundo requerem a construção de mais e mais mansões de repouso no mundo espiritual. Essa é a ocasião —talvez a maior — para as mudanças que estão constantemente ocorrendo aqui. Mas há outras ainda, e mais agradáveis.
Às vezes um grande número de almas expressa o desejo de ampliar uma dessas mansões do aprendizado. Não há nenhuma dificuldade em aceder a tal desejo, visto que não é egoísta, visto que ela estará lá para todos usarem e go­zarem.
Em resposta a uma questão que propus a Edwin, ele me contou que uma nova ala deveria ser acrescentada à

grande biblioteca, onde passei tantos momentos agradáveis e proveitosos desde que me transformara em espírito. Foi-nos sugerido que talvez Rute e eu gostássemos de testemunhar o erguimento de um edifício espiritual.
Havia já grande número de pessoas reunidas quando chegamos, e com o mesmo propósito que lá nos levara; en­quanto esperávamos o início das operações, Edwin nos deu alguns pormenores preliminares.
Assim que se deseja algum novo edifício, o governante do reino é consultado. Desta grande alma e de outras simi­lares em caráter espiritual e capacidade só falarei mais tarde. Conhecendo, como conhece, tão profundamente os desejos e necessidades de todos os do, seu reino, nunca houve o caso em que algum novo edifício fosse pedido para o uso de todos, sem ser atendido.
O governante então transmite o pedido aos seus supe­riores em autoridade, que, por seu turno, o transmitem a outros mais elevados.
Reunimo-nos então no templo central da cidade, onde somos recebidos por aquele cuja palavra é lei, a grande alma, que há muitos anos terrestres tornou minha comunicação com o mundo terreno possível.
Ora, esse processo aparentemente complicado, de trans­mitir nosso pedido de um para outro, pode sugerir à mente os tortuosos métodos da burocracia com suas delongas e adiamentos.
O método pode parecer semelhante, mas o tempo gasto é uma coisa muito diferente. Não é exagerado dizer que no espaço de alguns minutos terrenos, nossos pedidos já são feitos, e a permissão -- acompanhada de uma bênção — é concedida. Nessas ocasiões é que temos razões para nos rejubilarmos, e o fazemos com grande prazer.
O passo seguinte é consultar um arquiteto, e, como se pode imaginar, temos um número inesgotável que nos pode auxiliar. Trabalham pela mera alegria que lhes advém da

criação de algum grandioso edifício a ser usado para o bem de seus concidadãos. Esses bons homens trabalham e cola­boram de uma maneira que seria quase impossível sobre a terra. Aqui não são tolhidos pela ética profissional, ou limi­tados pela mesquinhez da inveja. Cada um tem mais alegria e orgulho de servir do que o outro, e nunca há discórdias e choques no esforço de introduzir ou impor idéias individuais, em prejuízo das dos outros. Direis talvez que tal unidade completa está longe e acima da natureza humana e que tais pessoas não seriam humanas se não discordassem ou por qualquer outra maneira mostrassem sua individualidade.
Antes de rejeitardes meu argumento como altamente im­provável ou de me acusardes de pintar um quadro de perfeição impossível a não ser nos mais elevados reinos, deixai-me expor o simples fato de que discórdia a respeito de assuntos como agora discutimos não poderia existir nestes planos que ora habito. E se ainda insistirdes que isto é impossível, eu declaro que Não: é perfeitamente natural. Quaisquer dons que possamos possuir em espírito, são parte da essência deste reino, onde não temos idéias presunçosas sobre o poder ou a excelência desses dons. Reconhecemo-los e com humildade, sem convencimento, despretensiosamente e sem egoísmo, gratos pela oportunidade de trabalhar, con amore, com nossos co­legas ao serviço do Grande Inspirador.
É isto, em substância, o que um dos grandes arquitetos me disse em referência a seu próprio trabalho.
Depois de os planos de novos edifícios serem traçados com orientação do governante do reino, há uma reunião dos empreiteiros-mestres. Estes eram na maioria pedreiros na terra, e continuam a exercer suas atividades aqui. Fazem-no é claro, porque o trabalho lhes agrada como* acontecia quando eram encarnados, e aqui têm condições impecáveis nas quais podem prosseguir o seu trabalho. Fazem-no com a grande liberdade de ação que lhes era negada na terra, mas que aqui é a sua herança. Outros que não eram pedreiros de profissão, aprenderam aqui os métodos espirituais de cons­

trução e, pela pura alegria de o fazer, dão valiosa ajuda a colegas mais experimentados.
Os pedreiros são as únicas pessoas ligadas à construção, visto que os edifícios espirituais não requerem tantas minúcias como os da terra, tais como iluminação e aquecimento. Nossa luz provém de grande fonte central de luz e o calor é uma das características do reino.
O acréscimo que estava sendo feito à biblioteca cons-sistia em um anexo e não era de grandes proporções. Nossa biblioteca tem pelo menos um traço em comum com as ter­restres. Vem a época em que a quantidade de livros excede o espaço em que abrigá-los e, no nosso caso, o excesso tende a ser maior, porque não só temos cópias dos livros terrenos em nossas estantes, mas também volumes escritos apenas em espírito. Incluídos entre eles há obras referentes à vida espiritual, aos fatos da vida aqui, e ensinamentos espirituais escritos por autoridades que possuem conhecimentos infalíveis sobre o assunto, e que pertencem às esferas superiores.
O edifício deste anexo não era portanto, o que se cha­maria um esforço maior, e requeria o auxílio de apenas alguns trabalhadores. Era simples no traçado, consistindo de dois ou três salões de tamanho médio.
Estávamos mais ou menos perto do grupo de arquitetos e pedreiros, encabeçados pelo legislador do reino. Notei que todos tinham a aparência de extrema felicidade e alegria, e as piadas circulavam no meio deste grupo jovial.
Era estranho para mim e Rute — e Edwin já o notara antes — pensar que um edifício ia ser erguido dali a pouco, porque desde minha chegada ao mundo espiritual eu não vira sinais de qualquer movimento de construção em parte alguma. Todos os edifícios e templos já estavam construídos e nunca me ocorreu que precisassem de mais algum. Pen­sando um pouco, é claro, veríamos que as casas espirituais estão sempre sendo construídas, enquanto outras são demolidas desde que não sejam mais necessárias. As mansões do saber pareciam tão permanentes aos meus olhos inexperientes, tão

completas, que nunca imaginara fosse necessário fazer-lhes acréscimos.
Por fim, houve sinais de que se aproximava o início.
Deve-se lembrar que o ato de construir no mundo espi­ritual é essencialmente uma operação de pensamento. Não é de surpreender, portanto, que eu diga que não se via por ali a usual confusão de apetrechos ligados às contrações ter­renas, os andaimes, cimento, tijolos e vários outros objetos familiares. Estávamos para testemunhar, de fato, um ato de criação — criação pelo pensamento — e como tal não há necessidade de equipamento físico.
O governante do reino deu alguns passos à frente e de costas para nós, mas olhando para o local onde se iria erguer a nova ala, pronunciou uma breve mas apropriada oração. Em linguagem simples pediu auxílio ao Grande Criador para a obra que iria ser iniciada.
Sua breve prece trouxe imediata resposta, na forma de um vivido raio de luz que desceu sobre êle e os que se reuniam à volta. Assim que isto se deu os arquitetos e pedreiros se moveram para perto dele.
Todos os olhos se voltaram para o espaço vazio ao lado do edifício principal, e para o qual se dirigia um segundo raio de luz que emanava do governante e dos pedreiros. Ao atingir o espaço vazio o raio de luz formou um tapete corus-cante sobre o solo. Este aumentou gradualmente de inten­sidade, largura e altura, mas parecia que ainda lhe faltava algo de substancial. Era idêntico em côr ao edifício principal, mas era apenas isso por enquanto.
Lentamente a forma ganhou volume até alcançar a altura
requerida. Podíamos ver agora que combinava exatamente
com a estrutura original, até nos menores ornamentos es-
culpidos.                                                                                           |j

Enquanto estava neste ponto, os arquitetos aproximaram-se e examinaram-na detalhadamente.   Podíamos vê-los andando á dentro e finalmente desapareceram de nossas vistas, por

um curto espaço de tempo, até que voltaram ao governante com a declaração de que tudo estava em ordem.
Agora o raio de luz descendente tornou-se muito mais intenso. Podia-se perceber que a forma meio nebulosa, agora adquiria uma inequívoca aparência de solidez, à medida que a concentração de pensamentos acrescentava camada sobre camada de progressiva densidade sobre o simulacrum.
Pelo que pude observar, parecia caber ao governante fornecer a cada pedreiro a quantidade de força requerida pela sua tarefa. Êle na verdade agia como agente distri­buidor da força magnética que descia sobre êle. Esta se dividia em um número de raios de diferentes cores e inten­sidade, que correspondem ao apelo direto ao Grande Arqui­teto. Não havia o menor sinal perceptível de falhas ou diminuição na aplicação da substância-pensamento. Os pe­dreiros pareciam trabalhar em completa unanimidade de concentração, ao mesmo tempo que o edifício atingia sua total solidez com notável grau de igualdade.
Depois do que me pareceu um curto espaço de tempo, o prédio cessou de adquirir mais intensidade, os raios foram interrompidos, e eis perante nós a ala terminada, perfeita em todos os detalhes, uma exata réplica do edifício principal, belíssimo em côr e forma, e digno do alto fim a que seria devotado.
Aproximamo-nos para examinar de perto os resultados do feito que acabara de ser realizado. Passamos nossas mãos sobre a macia superfície para convencermo-nos de que era realmente sólido. Rute e eu não éramos os únicos a fazer tal coisa, visto que havia outras pessoas que testemunhavam isso pela primeira vez, e com igual surpresa e espanto.
O processo que regula a construção de nossas casas parti­culares e bangalôs difere um pouco do que agora acabei de descrever. O requisito indispensável para se possuir uma casa espiritual é o direito de possuí-la, um direito que é ganho unicamente pela espécie de vida que levamos quando encarnados, e por nosso progresso espiritual depois da tran­sição para este mundo. Uma vez ganho esse direito, nada nos impede de ter tal residência, se o desejarmos.
Diz-se muitas vezes que construímos nossos lares espi­rituais durante nossas vidas na terra — ou depois. Isto num sentido mais amplo. O que conseguimos foi o direito de construir, porque demanda um perito a construção de uma casa que justifique o seu nome. Minha própria casa foi construída durante minha vida terrena por construtores tão eficientes quanto aqueles que ajudaram a construir o anexo da biblioteca.
Quando raiar o dia em que pelo progresso espiritual eu me veja obrigado a prosseguir, deixarei minha casa. Mas dependerá de mim o deixá-la para outros ou demoli-la. É costume, disseram-me, doá-la ao governante do reino que poderá dela dispor em favor de outros à sua escolha.

Continua no p´roximo Bloco - IV Tempo e Espaço






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