sexta-feira, 30 de agosto de 2013

A VIDA NOS MUNDOS INVISÍVEIS -BLOCO VI

X.  Uma Visita

Nosso hospedeiro nos contou que o poder do pensamento é quase ilimitado no mundo dos espíritos, e que quanto maior o esforço de concentração de idéias, maiores os resultados.
Nossos meios de locomoção pessoal são feitos através de pensamentos, e podemos aplicar esses mesmos métodos ao que o mundo chama de objetos inanimados.  É claro que nestes reinos nada é inanimado, e por isso nossos pensa­mentos podem ter uma influência direta sobre as inúmeras coisas que compõem o mundo espiritual.  As embarcações podem flutuar e mover-se sobre as águas; elas são animadas pela força viva que anima todas as coisas aqui e, se desejamos mover-nos sobre a água, temos apenas que focalizar nossa mente nessa direção, com essa intenção, e nossos pensamentos produzem o resultado desejado de movimento.   Poderíamos, se desejássemos, pedir aos amigos cientistas que nos forneces­sem esplêndidas máquinas geradoras de força motriz, e eles teriam prazer em nos atender.    Mas teríamos então que focalizar nossos pensamentos sobre a máquina, para fazê-la gerar a necessária força.  Por que, pois, fazer todos esses rodeios para produzir o mesmo resultado, quando podemos fazê-lo diretamente e com a mesma eficiência?
Mas não se deve concluir disso que alguém possa mover um barco através das águas, só com o pensar. Isso requer, como tantas outras coisas, a sabedoria necessária, sua apli­cação em linhas bem ordenadas e a prática da arte. A aptidão natural ajuda muito nesses casos, e nosso anfitrião nos disse que em pouco tempo dominou a questão. Uma vez atingida essa habilidade, sentimos uma enorme sensação de poder bem aplicado, e não apenas de poder, mas de poder de pensamento, de maneira única e talvez inacredi­tável. Perfeito como tudo o mais neste reino, o movimento de um objeto tão grande como este barco ilustra e aumenta a maravilha da vida espiritual. Nosso anfitrião explicou que • isto era apenas seu ponto de vista pessoal, e não devia ser tomado como axioma. Seu entusiasmo era aumentado pelo seu amor à água e aos navios.
Notamos que êle manobrava o barco da maneira usual, com um leme operado por uma roda do tombadilho. Já achava bastante ter que prover a força para mover o barco. Se o desejasse poderia combinar as duas ações em uma só.
Mas preferia o velho método de guiar à mão, pelo prazer que o trabalho físico lhe proporcionava. Uma vez dado o movimento ao navio, podia esquecer-se disso até desejar parar. Ao simples desejo de parar, fosse repentina ou gradualmente, o barco parava imediatamente, e sem perigo algum de aci­dentes, que não podem existir nestas paragens.
Enquanto ele nos explicava isto a mim e a Rute, Edwin estava entretido em conversar com a esposa do hospedeiro. Nossa velocidade havia aumentado até um andamento es­tável, e movíamo-nos na direção de uma das ilhas. O iate deslocava-se sem oscilação, mas podia se perceber o mo­vimento das águas, enquanto as ondas apartadas pela quilha produziam os mais harmoniosos sons, e as mais belas tona­lidades surgiam da água agitada. Observamos que na nossa esteira a água rapidamente voltava à posição antiga, não deixando sinais de que tivéssemos passado por ela.
Rute ficou simplesmente extasiada e correu para nossa hospedeira, no ardor de suas novas experiências. Esta, que compreendia bem o entusiasmo da jovem amiga, partilhava seu contentamento. Apesar de nada aqui lhe ser novidade, ela disse que nunca deixava de se admirar, mesmo fami­liarizada com o navio-lar, com as gloriosas belezas e prazeres dispensados aos moradores das terras espirituais.
Estávamos então suficientemente próximos da ilha para poder vê-la completamente, e o barco alterou seu ramo para bordejá-la. Depois de assim navegar por algum tempo, en­tramos numa pequena baía que formava um pitoresco porto natural.
A ilha correspondeu à nossa expectativa em beleza cê­nica. Não havia muitas habitações; as que podiam ser vistas eram apenas residências de verão. Mas a principal carac­terística do lugar era a quantidade de árvores, nenhuma alta, mas todas de vigoroso desenvolvimento. Viam-se nos galhos os mais belos pássaros, cuja plumagem era uma orgia de cores. Alguns voavam, outros passeavam majestosamente pelo chão.  E não se atemorizavam conosco.   Acompanhavam-nos
__---- segue próxima leitura


se estivéssemos andando; e se estendíamos os braços, os menores se empoleiravam nos dedos. Pareciam conhecer-nos, e saber que seria absolutamente impossível que os maltratásse­mos. Não tinham que viver em constante busca de alimentos nem se defender contra o que na terra seriam os seus inimigos naturais. Eram, como nós, parte do mundo eterno do espírito, gozando sua vida eterna, como nós o fazíamos.
Os pássaros de mais colorida plumagem eram evidente­mente da espécie que vive na floresta tropical, e raramente vistos, até chegarmos ao mundo espiritual. Pela perfeita adaptação de temperatura podiam eles viver tão bem quanto os de aparência menos espetacular. E, em grande harmonia, cantavam e chilreavam, numa verdadeira sinfonia. Nunca se ouvira tamanha exaltação sonora: cada som se confundia, de maneira extraordinária, com todos os outros; e mesmo assim, não eram estridentes embora o canto de alguns passa­rinhos fosse bastante alto. Mas o que mais nos embevecia era a amizade pura e verdadeira que demonstravam em relação a nós fato inédito, pois na terra os pássaros vivem, pode-se dizer, num mundo diferente do dos homens. Aqui, porém, todos pertencíamos a um mundo livre, e a com­preensão entre nós e os pássaros era recíproca. Quando lhes falávamos sentíamos que compreendiam o que dizíamos, da mesma sutil maneira que nós podíamos compreender o que eles diziam.
Nossos amigos, é claro, haviam passado por tudo isso anteriormente, mas para mim e Rute, era uma nova e mara­vilhosa experiência. Quando ponderei sobre essa questão, vi que, se tivesse raciocinado logo perguntaria: por que haveria Deus de criar pássaros e coisas belas apenas para uso da terra? E por que fazê-los sempre perecíveis? Deveriam ser negadas ao grande mundo do espírito as coisas belas que a terra desfruta? Tínhamos a resposta diante dos olhos. É próprio da presunção e auto-importância do homem pensar que a beleza seja criada para seu exclusivo prazer na terra. Julga êle ter o monopólio da beleza. Quando morre, des­perta para o fato de que na realidade nunca viu ainda quão grande pode ser a beleza, e torna-se então humilde e silen­cioso, talvez pela primeira vez na vida. Ê uma lição salutar, o despertar do espírito, e acredite, meu amigo, às vezes é um choque para muita gente.
A profusão de cores de todos os pássaros à nossa volta era demais para ser vista de uma vez. Ultrapassa qualquer descrição, e seríamos incapazes de dá-la. Passeamos através de bosques deliciosos, passamos por murmurantes riachos, através de clareiras de veludo verde, como num verdadeiro reino encantado. Encontramos no caminho várias pessoas, que ao ver-nos cumprimentavam-nos amistosamente. Mos­travam-se felizes entre os pássaros. Disseram-nos que esta parte da ilha era dedicada exclusivamente aos pássaros, e que nenhuma outra forma de vida animal se intrometia aqui. Não porque seja perigoso isso é impossível mas porque as aves são mais felizes com a própria espécie.
 Afinal retornamos ao iate e fizemo-nos ao mar de novo. Estávamos curiosos para saber onde nosso anfitrião havia adquirido seu lar flutuante. Tal engenho náutico requer peritos para planejá-lo e outros tantos para construí-lo. Disse--nos êle que um barco dependia das mesmas condições que nossas casas espirituais, ou qualquer outro edifício. O requi­sito é que ganhemos o direito de possuí-lo. Isso sabíamos. O que acontece porém às pessoas que na terra desenhavam e construíam botes, como meio de vida ou como passatempo? Neste último caso principalmente, eles teriam que abandonar suas tarefas prediletas? Não, aqui todos têm meios e motivos para continuá-las, quer por prazer, quer por trabalho.
A arte de construir uma embarcação é altamente técnica, e os métodos do mundo espiritual, diferentes dos da terra, precisam ser dominados. Mesmo que adquiramos o direito de possuir, no mundo espiritual, teremos sempre o auxílio dos amigos na construção do edifício atual. Podemos criar em nossas mentes, quando na terra, o formato daquilo que am­bicionamos ter uma casa, um jardim, ou o que quer que seja. Será então um pensamento-forma, e será convertido naquilo que desejamos, com o auxílio de peritos.


Nossa volta foi tão aprazível quanto a ida. Quando chegamos à terra, nosso anfitrião nos fêz um convite para irmos visitá-lo a bordo, sempre que o desejássemos.
Quando caminhávamos pela praia, Edwin nos fêz lembrar do grande prédio no centro da cidade, dizendo-nos que em breve haveria uma visita dos planos superiores, e por isso grande concentração se formaria no templo que terminava em cúpula. Gostaríamos de ir com êle? Não era de forma nenhuma um ato específico de adoração a esse visitante. Coisas como adoração não requerem esforço consciente (vêm espontaneamente do coração) mas o nosso visitante traria consigo não só sua própria radiação, como a radiação das esferas celestiais que êle honrava. Imediatamente expressamos o desejo de acompanhar Edwin, visto que não nos aventu­raríamos a ir sós; e além disso estávamos sob a direção do nosso amigo.
Ao longo da larga avenida arborizada, notamos que fazíamos parte de um grande número de pessoas que cami­nhavam numa mesma direção e aparentemente com as mesmas intenções. É estranho, mas não havia a confusão própria das grandes aglomerações terrenas. Era uma sensação extraor­dinária, que Rute compartilhava comigo. Temíamos o costu­meiro empurrar e acotovelar das multidões na terra, mas logo caímos em nós e nos rimos de que pudéssemos ter tido aqui tal idéia, por um momento sequer. Sentimos que tudo estava em perfeita ordem, que todos sabiam o que fazer e aonde ir. Sentimos que nos aguardavam, pelo apoio que lhes daríamos, e que boas-vindas pessoais nos esperavam. Não era isto suficiente para afastar toda sensação de inquie­tação e desconforto?
Havia, além disso, uma unidade de pensamento entre nós, que não é possível na terra, mesmo entre aqueles que têm as mesmas crenças religiosas. Que religião existe em que todos os adeptos são inteiramente da mesma opinião? Nenhuma. Acha-se essencial na terra que, para dar graças ao Ente


Supremo, ou para adorá-lo, deve haver um ritual complexo, formulários e cerimônias dos quais tanta diversidade de opiniões, quantas são as religiões.
Aqui temos templos onde podemos receber os grandes mensageiros dos reinos superiores, lugares apropriados para receber os representantes do nosso Pai, e de onde esses men­sageiros podem enviar graças e petições à Grande Nascente de tudo.   Não adoramos cegamente como na terra.
Ao aproximarmo-nos do templo podíamos nos sentir carregados de força espiritual. Edwin nos contou que isso acontecia sempre, porque o imenso poder trazido pelos altos visitantes permanecia intato dentro de um amplo círculo ao redor do templo. Era por esta razão que êle se achava isolado, sem outras construções nas proximidades. Apenas jardins o rodeavam um mar de flores, estendendo-se a perder de vista, e apresentando tal abundância de cores brilhantes, como a terra jamais pôde ver. E de tudo ema­navam os mais celestiais sons de música e os mais delicados perfumes, cujo efeito era a mais pura exaltação de espírito. Sentimo-nos elevados acima de nós mesmos, e num outro mundo.
O edifício em si era magnífico e grandioso. Parecia feito do mais fino cristal, mas não era transparente. Pilares ma­ciços brilhavam ao sol, ao mesmo tempo que as esculturas cintilantes espargiam por toda parte miríades de reflexos brilhantes. Nunca julguei possível haver semelhantes brilhos, porque as superfícies polidas não refletiam a luz comum, mas emanava delas também uma luz espiritual.
Edwin conduziu-nos aos lugares que deviam ser nossos, e que nos pareciam familiares, como alguma poltrona predileta em nosso lar.
Acima de nós erguia-se a cúpula enorme, de ouro, mara­vilhosamente trabalhada, que refletia as cores das outras partes do edifício. Mas o foco das atenções era o santuário de mármore palavra que uso, na falta de melhor no fim



do templo. Tinha um balaustrada baixa com uma saída central no topo de uma escada que conduzia ao solo. Po­diam-se ouvir notas musicais, mas de onde vinham, eu não sabia. Não se viam músicos, mas a melodia era evidente­mente produzida por uma grande orquestra — de cordas somente.
O santuário, que era de dimensões espaçosas, estava repleto de seres dos planos superiores, com execção de um espaço no centro, que eu supunha reservado ao nosso visi­tante. Estávamos todos sentados, e conversava-se calma­mente. Dali a pouco apercebemo-nos da presença da majes­tosa figura de um homem de cabelos cor de azeviche, seguido de perto — para grande surpresa minha — pelo bondoso egípcio que encontráramos na casa de Edwin. Para aqueles que já haviam testemunhado tais visitas, a chegada de ambos foi a indicação da vinda da alta personalidade, e portanto todos se puseram de pé. Então, perante nossos olhos, apareceu primeiro uma luz, que poderíamos dizer ofuscante; mas, con­centrando o olhar, imediatamente nos acostumamos a ela, sem sentir desconforto. Na verdade, como descobri mais tarde, a luz é que se adaptava a nós, isto é, diminuía de intensidade de acordo com nosso reino. Nas extremidades era quase dourada, tornando-se mais brilhante à medida que se apro­ximava do centro. E no meio, vagarosamente, ela tomou a forma do nosso visitante. Ao ganhar corpo podíamos ver que era um homem de aparência jovem, — juventude espiritual —
mas sabíamos que ele arcava com os três atributos de Sabe­doria, Conhecimento e Pureza. Seu semblante irradiava transcendente beleza, os cabelos eram dourados, e em torno de sua cabeça brilhava um diadema de luz. Suas vestimentas eram da mais diáfana qualidade, e consistia em alva túnica bordada com uma larga barra dourada, enquanto dos ombros caía um manto de azul cerúleo, preso no peito por uma grande pérola rósea. Seus movimentos eram majestosos ao erguer os braços para nos abençoar. Permanecemos de pé e silenciosos, enquanto nossos pensamentos se elevavam para Aquele que nos enviava tão maravilhoso ser. Enviamos graças


e petições. Para mim, eu tinha um pedido a fazer, e fi-lo.
Não me é possível descrever a exaltação de espírito que eu sentia na presença, embora distante, daquele nosso hós­pede. Não sei quanto tempo eu pude permanecer naquele templo sem sentir a esmagadora consciência de que eu era muito, muito ínfimo, na escala da evolução espiritual. E no entanto eu sabia que êle me enviava, como a todos, pensa­mentos de encorajamento, de boa esperança, de bondade no mais alto grau, o que me fêz sentir que nunca devia deses­perar de atingir o reino espiritual mais elevado, e que havia útil trabalho para eu prestar aos homens.
Com uma bênção final aquele resplendente ser desa­pareceu de nossas vistas.
Permanecemos sentados um pouco, e gradualmente o templo começou a esvaziar-se. Eu não sentia vontade de me mover e Edwin disse que podíamos ficar quanto quiséssemos. O recinto estava, portanto, quase vazio, quando vi o egípcio se aproximar de nós. Cumprimentou-nos efusivamente e pediu-me para o acompanhar, visto que me queria apresentar ao seu Mestre. Agradeci-lhe o interesse, e qual não foi o meu espanto quando me conduziu à presença do homem com quem estava no santuário. Só o vira de meu lugar, mas perto dele podia admirar um par de olhos negros coruscantes que combinavam com seus cabelos, e que eram mais acen­tuados pelo contraste com a palidez de sua cútis. As cores de sua vestimenta eram azul, branco e ouro, e apesar de serem de qualidade superior, não tinham a intensidade das do visitante principal. Tive a impressão de estar na presença de um homem muito sábio, o que era verdade, e também de grande senso de humor. É preciso nunca se esquecer de que graça e humor não são, e nunca serão, prerrogativa dos habitantes da terra, embora muitos queiram reclamar para si o seu monopólio, e negar nossa alegria jovial. Continuaremos a rir, a despeito da possível desaprovação deles.)


O amável egípcio apresentou-me a seu mestre, e este me tomou a mão e sorriu de tal maneira que afastou de mim, completamente, qualquer acanhamento. Na verdade êle irra­diava autoconfiança e nos deixava inteiramente à vontade. Podia-se chamá-lo, sem desrespeito, de perfeito anfitrião. Quando me falou, sua voz era agradàvelmente modulada e suave. Suas palavras me encheram de alegria e ao mesmo tempo de espanto: — "Meu bem-amado Mestre, que acabais de ver, me manda dizer que vossa oração foi atendida, e vossos desejos realizados. Não temais, porque aqui as pro­messas feitas são sempre cumpridas". Disse-me então que me seria pedido um certo tempo de espera, porque era neces­sário que uma corrente de acontecimentos tivesse lugar antes de as exatas circunstâncias serem realizadas. O tempo logo passaria, e enquanto isso eu podia continuar meu trabalho com os amigos. Se alguma vez desejasse conselhos, meu bom amigo Edwin poderia visitar o amigo egípcio, cujas orientações estariam ao meu dispor. Deu-me, então, sua bênção, e achei-me sozinho, só com meus pensamentos, e com a recor­dação duradoura da fragrância celestial do nosso resplendente visitante.
Reuni-me a Rute e Edwin, a quem contei da minha feli­cidade. Ambos rejubilaram-se às minhas boas notícias. Sentia agora vontade de voltar à minha casa, e perguntei a eles se me acompanhariam. Para lá nos dirigimos, e fomos diretos à biblioteca. Numa das prateleiras havia um livro especial que eu escrevera ainda na terra, e que desejaria nunca ter escrito. Removi o volume da prateleira, deixando o espaço vazio. De acordo com a minha oração eu deveria preencher aquele espaço com outro livro, escrito depois de ser espírito, o produto de minha mente após ter visto a verdade.
De braços dados, caminhamos para o ensolarado jardim — e para o celestial sol da eternidade.





SEGUNDA PARTE






UM MUNDO DESCONHECIDO




I.  As Flores

Depois de ter passado a espírito, uma das minhas pri­meiras experiências foi a consciência de uma sensação de tristeza, não minha, porque me sentia supinamente feliz, mas dos outros, e ficava intrigado por saber de onde provinha.
Edwin me contou que essa tristeza se elevava do mundo terreno, e era causada pela dor do meu passamento. Logo cessou, entretanto, e ele me informou que o esquecimento já principiava a chegar. Esta experiência só, meu bom amigo, é de molde a produzir sentimentos de humildade, se não existia antes.
Eu, asseguro-lhes, dava pouca importância à popula­ridade. A descoberta, portanto, de que a minha memória se apagava rapidamente das mentes de pessoas da terra, não me magoou nem um pouco. Eu havia escrito e pregado para que fizessem o bem, e esse, via agora, era microscópico. Disseram-me que muitas pessoas que estavam nas graças do público quando vivas, descobriram, quando se desfizeram de seus corpos, que a fama e o prestígio não os acompanharam ao mundo espiritual. Desaparecera a admiração que havia sido sua experiência diária.   Naturalmente que entristecera


essas pessoas o deixar para trás sua importância e isso dava-lhes uma sensação de solidão, tanto mais que, além disso, o mundo rapidamente se esquecia delas.
Minha própria reputação terrena não fora muito grande, mas conseguira certa posição entre meus correligionários.
Minha transição fora calma e pacífica, e sem circunstâncias inesperadas. Não foi um golpe ter que deixar o mundo. Não tivera ligações a não ser com meu trabalho. Edwin me falou a respeito de outros cuja morte foi extremamente infeliz, e cujo estado espiritual à chegada aqui era mais infeliz ainda. Muitos, que eram grandes na terra, se acharam dimi­nuídos em espírito. E muitos, desconhecidos na terra, aqui se viram espiritualmente tão famosos que ficaram estupefatos. Não são todos, de maneira nenhuma, que estão destinados aos belos reinos do sol e verão eternos.
Já lhes dei uma idéia dos reinos da obscuridade e semi-obscuridade, onde tudo é árido e triste, onde habitam as almas que podem se elevar acima das trevas, se assim o desejarem e lutarem. Existem muitos que passam sua eter­nidade visitando essas obscuras regiões, para tentar arrancar esses infelizes à sua miséria, e pô-los no caminho da luz e do progresso espiritual.
É meu privilégio ir com Edwin e Rute a essas regiões além da névoa que as separa da luz. Não tenho a intenção de os levar ainda a essas regiões de miséria e infelicidade. Mais tarde espero contar-lhes algumas das minhas experiências. Por enquanto há outros e mais agradáveis assuntos de que prefiro falar.
Há muitas almas no plano terrestre que tentam aprofundar os inúmeros mistérios da vida. Propõem teorias das mais diversas, tentando explicar isso ou aquilo, teorias que com o correr do tempo podem vir a constituir grandes verdades. Algumas dessas hipóteses são tão remotas da verdade como é possível imaginar, outras, são meramente tolices. Mas há também pessoas que recusam pensar por si sós e que firme­mente mantêm a crença de que enquanto são encarnadas não


precisam saber coisa alguma da vida que está à sua espera. Afirmam que não é intenção de Deus que saibam tais coisas, e que quando chegarmos a espíritos saberemos tudo.
Há dois extremos de idéias — as dos teoristas e as dos par­tidários da porta fechada. Ambas as escolas recebem duros gol­pes, quando entram nas terras espirituais para todo o sempre. Indivíduos com estranhas teorias, vêem-nas demolidas pelo simples fato de encararem agora a absoluta verdade. Des­cobrem que a vida no espírito não é tão complexa como diziam. Em muitos casos é bem mais simples do que na terra, porque não temos os problemas que constantemente preocupam e afli­gem os terrenos, problemas de religião e política, por exemplo, que através dos tempos têm causado revoluções sociais que ainda têm repercussão no mundo terreno do momento presente.
O estudante de ciências ocultas está arriscado a cair em erros, tanto como o estudante de assuntos religiosos. Êle faz afirmativas tão dogmáticas quanto as que emanam da religião ortodoxa, afirmações essas que estão bem longe da verdade.
O período em que vivi no mundo espiritual é nada — absolutamente nada — em comparação com algumas das grandes almas com quem tive o privilégio de falar. Mas elas mostraram-me algo das suas vastas reservas de conheci­mentos, coisas que minha mente era incapaz de compreender. De resto, eu — assim como milhões de outros — estou perfei­tamente satisfeito em esperar pelo dia em que minha inteli­gência esteja suficientemente adiantada para receber as maiores verdades.
Um assunto que causa alguma perplexidade refere-se às flores que temos no mundo dos espíritos. Alguns dirão: por que flores? Qual o seu significado ou fim? Têm elas alguma significação simbólica?
Façamos a mesma pergunta aos terrestres referente às flores que crescem na terra. Têm elas algum significado simbólico?  A resposta a ambas é Não!  As flores são dadas m
à terra para auxiliar a embelezá-la e para deleite e encan-tamento daqueles que as admiram. O fato de que elas servem      outros fins úteis é mais uma razão para a sua existência. As flores são essencialmente belas, alimentadas pelo Supremo Criador, dadas a nós como um dom precioso, exibindo-nos sua coloração, seus formatos, e perfumes, numa expressão infinitesimal da Grande Mente. Vocês têm esta glória no plano terrestre. Teremos nós que .ser privados delas no mundo espiritual porque são consideradas terrenas ou porque ne­nhum significado profundo e abstruso pode ser dado à sua existência?
Temos aqui as mais lindas flores, algumas, como as fa­miliares e queridas da terra, outras, conhecidas apenas no mundo espiritual, mas todas são soberbas, são a alegria perpétua daqueles a quem elas rodeiam. São criações divinas, cada uma exalando o puro hálito espiritual e sustentadas pelo seu Criador e por nós todos, pelo amor que lhe ofertamos. Se não as quiséssemos suposição impossível elas seriam varridas da terra. E que teríamos em seu lugar? E quem forneceria a riqueza de cores que vem delas?
Quando somos apresentados pela primeira vez às flores e árvores, a toda a sua luxuriante natureza espiritual, perce­bemos imediatamente algo que a natureza terrena nunca pareceu possuir, isto é, uma inteligência inerente dentro de todas as coisas que crescem. As flores terrenas, apesar de vivas, não se manifestam imediatamente quando nos pomos em contato com elas. Mas aqui é diferente. As flores espi­rituais são imperecíveis e isso deveria imediatamente sugerir que mais do que vida dentro delas. São parte da imensa corrente de vida que flui diretamente d'Êle. Essa corrente nunca cessa nem diminui e é, além disso, continuamente ali­mentada pela admiração e amor que nós, gratamente, lhes dedicamos. Não podemos deixar de ficar maravilhados, quando seguramos a mais minúscula flor entre as mãos e sentimos ta­manho influxo de poder magnético, tanta força revigorante, tal refortalecimento de todo o nosso ser, e quando ficamos sabendo, em verdade, que essas forças reanimadoras nos vêm direta-


mente da Fonte de todos os bens. Não, não há outro significado por detrás das flores espirituais além daquela beleza exprimida pelo Pai do Universo, e, por certo, isso é bastante. Êle não deu nenhum estranho simbolismo às suas criações impecáveis.  Por que o faríamos nós?
A maioria das flores não se devem apanhar. Isso é destruí-las, é destruir o contato direto com o Criador. É possível colhê-las, certamente; nenhuma calamidade desas­trosa nos advém por isso. Mas quem quer que as apanhe certamente o lamentará profundamente. Pensem em algum pequeno objeto que possuam e prezem acima de tudo, e pensem depois em destruí-lo deliberadamente. Causaria ex­trema tristeza fazê-lo, embora a perda pudesse ser insigni­ficante. Tal seria sua emoção quando impensadamente destruísse flores que não devem ser apanhadas.
Mas há flores, e muitas, expressamente para serem co­lhidas, e muitos o fazem, levando-as para suas casas como fazemos na terra, e pelas mesmas razões.
Essas flores apanhadas sobrevivem por quanto tempo quisermos conservá-las. Quando nosso interesse por elas começa a desvanecer, rapidamente se desintegram. Não haverá restos murchos desagradáveis à vista, porque não pode haver morte na terra da vida eterna. Simplesmente notamos que nossas flores desapareceram e podemos trocá-las então por outras, se o desejarmos.

Continua no próximo Bloco -  O Solo  ( Como deve ser o solo no plano espirual criado por Deus?)








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