X. Uma Visita
Nosso hospedeiro
nos contou que o poder do pensamento é quase ilimitado no mundo dos espíritos,
e que quanto maior o esforço de concentração de idéias, maiores os resultados.
Nossos meios de locomoção pessoal são feitos
através de pensamentos, e podemos aplicar esses mesmos métodos ao que o mundo
chama de objetos inanimados. É claro que nestes
reinos nada é inanimado, e por isso nossos pensamentos podem ter uma
influência direta sobre as inúmeras coisas que compõem o mundo espiritual. As embarcações podem flutuar e mover-se sobre
as águas; elas são animadas pela força viva que anima todas as coisas aqui e,
se desejamos mover-nos sobre a água, temos apenas que focalizar nossa mente
nessa direção, com essa intenção, e nossos pensamentos produzem o resultado
desejado de movimento. Poderíamos, se
desejássemos, pedir aos amigos cientistas que nos fornecessem esplêndidas
máquinas geradoras de força motriz, e eles teriam prazer em nos atender. Mas teríamos então que focalizar nossos
pensamentos sobre a máquina, para fazê-la gerar a necessária força. Por que, pois, fazer todos esses rodeios para
produzir o mesmo resultado, quando podemos fazê-lo diretamente e com a mesma
eficiência?
Mas não se deve concluir
disso que alguém possa mover um barco através das águas, só com o pensar. Isso
requer, como tantas outras coisas, a sabedoria necessária, sua aplicação em
linhas bem ordenadas e a prática da arte. A aptidão natural ajuda muito nesses
casos, e nosso anfitrião nos disse que em pouco tempo dominou a questão. Uma
vez atingida essa habilidade, sentimos uma enorme sensação de poder bem
aplicado, e não apenas de poder, mas de poder de pensamento, de maneira única e
talvez inacreditável. Perfeito como tudo o mais neste reino, o movimento de um
objeto tão grande como este barco ilustra e aumenta a maravilha da vida espiritual.
Nosso anfitrião explicou que • isto era apenas seu ponto de vista pessoal, e
não devia ser tomado como axioma. Seu entusiasmo era aumentado pelo seu amor à
água e aos navios.
Notamos que êle manobrava o
barco da maneira usual, com um leme operado por uma roda do tombadilho. Já
achava bastante ter que prover a força para mover o barco. Se o desejasse
poderia combinar as duas ações em uma só.
Mas preferia o velho método de guiar à mão, pelo
prazer que o trabalho físico lhe proporcionava. Uma vez dado o movimento ao
navio, podia esquecer-se disso até desejar parar. Ao simples desejo de parar,
fosse repentina ou gradualmente, o barco parava imediatamente, e sem perigo
algum de acidentes, que não podem existir nestas paragens.
Enquanto ele nos explicava
isto a mim e a Rute, Edwin estava entretido em conversar com a esposa do
hospedeiro. Nossa velocidade havia aumentado até um andamento estável, e
movíamo-nos na direção de uma das ilhas. O iate deslocava-se sem oscilação, mas
podia se perceber o movimento das águas, enquanto as ondas apartadas pela
quilha produziam os mais harmoniosos sons, e as mais belas tonalidades surgiam
da água agitada. Observamos que na nossa esteira a água rapidamente voltava à
posição antiga, não deixando sinais de que tivéssemos passado por ela.
Rute ficou simplesmente
extasiada e correu para nossa hospedeira, no ardor de suas novas experiências.
Esta, que compreendia bem o entusiasmo da jovem amiga, partilhava seu
contentamento. Apesar de nada aqui lhe ser novidade, ela disse que nunca
deixava de se admirar, mesmo familiarizada com o navio-lar, com as gloriosas
belezas e prazeres dispensados aos moradores das terras espirituais.
Estávamos então
suficientemente próximos da ilha para poder vê-la completamente, e o barco
alterou seu ramo para bordejá-la. Depois de assim navegar por algum tempo, entramos
numa pequena baía que formava um pitoresco porto natural.
A ilha correspondeu à nossa
expectativa em beleza cênica. Não havia muitas habitações; as que podiam ser
vistas eram apenas residências de verão. Mas a principal característica do
lugar era a quantidade de árvores, nenhuma alta, mas todas de vigoroso
desenvolvimento. Viam-se nos galhos os mais belos pássaros, cuja plumagem era
uma orgia de cores. Alguns voavam, outros passeavam majestosamente pelo
chão. E não se atemorizavam
conosco. Acompanhavam-nos
__---- segue próxima leitura
se estivéssemos andando; e se estendíamos os braços, os
menores se empoleiravam nos dedos. Pareciam conhecer-nos,
e saber que seria absolutamente impossível que os maltratássemos. Não tinham que viver em constante busca de alimentos
nem se defender contra o que na terra seriam os seus inimigos
naturais.
Eram, como nós, parte do mundo eterno do espírito,
gozando sua vida eterna, como nós o fazíamos.
Os pássaros de mais colorida plumagem eram evidentemente da espécie que vive na floresta tropical, e raramente
vistos, até chegarmos ao mundo espiritual. Pela perfeita
adaptação
de temperatura podiam eles viver tão bem quanto
os de aparência menos espetacular. E, em grande harmonia,
cantavam e chilreavam, numa verdadeira sinfonia. Nunca se ouvira tamanha exaltação sonora: cada som se confundia,
de maneira extraordinária, com todos os outros; e mesmo
assim, não eram estridentes embora o canto de alguns passarinhos fosse bastante alto. Mas o que mais nos embevecia
era a amizade pura e verdadeira que demonstravam em
relação a nós — fato inédito, pois na terra os pássaros vivem,
pode-se dizer, num mundo diferente do dos homens. Aqui,
porém, todos pertencíamos a um só mundo livre, e a compreensão entre nós e os pássaros era recíproca. Quando lhes
falávamos
sentíamos que compreendiam o que dizíamos, da mesma sutil maneira que nós podíamos compreender o que eles diziam.
Nossos amigos, é claro, já haviam passado por tudo isso
anteriormente, mas para mim e Rute, era uma nova e maravilhosa experiência. Quando ponderei sobre essa questão, vi que, se tivesse raciocinado logo perguntaria: por que haveria
Deus de criar pássaros e coisas belas apenas para uso da terra? E por que fazê-los sempre perecíveis? Deveriam ser
negadas ao grande mundo do espírito as coisas belas que a terra desfruta? Tínhamos a resposta diante dos olhos. É
próprio da presunção e auto-importância do homem pensar
que a beleza seja criada para seu exclusivo prazer na terra.
Julga êle ter o monopólio da beleza. Quando morre, desperta para o fato de que na realidade nunca viu ainda quão
grande pode ser a beleza, e torna-se então humilde e silencioso, talvez pela primeira vez na vida. Ê uma lição salutar,
o despertar do espírito, e acredite, meu amigo, às vezes é um choque para muita gente.
A profusão de cores de todos os pássaros à nossa volta
era demais para ser vista de uma só vez. Ultrapassa qualquer
descrição,
e seríamos incapazes de dá-la. Passeamos através
de bosques deliciosos, passamos por murmurantes riachos,
através de clareiras de veludo verde, como num verdadeiro
reino encantado. Encontramos no caminho várias pessoas,
que ao ver-nos cumprimentavam-nos amistosamente. Mostravam-se felizes entre os pássaros. Disseram-nos que esta
parte da ilha era dedicada exclusivamente aos pássaros, e que
nenhuma outra forma de vida animal se intrometia aqui.
Não porque seja perigoso — isso é impossível — mas porque
as aves são mais felizes com a própria espécie.
Afinal retornamos ao iate e fizemo-nos ao mar de novo.
Estávamos
curiosos para saber onde nosso anfitrião havia
adquirido
seu lar flutuante. Tal engenho náutico requer
peritos para planejá-lo e outros tantos para construí-lo. Disse--nos êle que um barco dependia das mesmas condições que
nossas casas espirituais, ou qualquer outro edifício. O requisito é que ganhemos o direito de possuí-lo. Isso já sabíamos.
O que acontece porém às pessoas que na terra desenhavam
e construíam botes, como meio de vida ou como passatempo?
Neste último caso principalmente, eles teriam que abandonar
suas tarefas prediletas? Não, aqui todos têm meios e motivos
para continuá-las, quer por prazer, quer por trabalho.
A arte de construir uma embarcação é altamente técnica,
e os métodos do mundo espiritual, diferentes dos da terra,
precisam ser dominados. Mesmo que adquiramos o direito
de possuir, no mundo espiritual, teremos sempre o auxílio dos
amigos na construção do edifício atual. Podemos criar em
nossas mentes, quando na terra, o formato daquilo que ambicionamos ter — uma casa, um jardim, ou o que quer que
seja. Será então um pensamento-forma, e será convertido
naquilo que desejamos, com o auxílio de peritos.
Nossa volta foi tão aprazível
quanto a ida. Quando chegamos à terra, nosso anfitrião nos fêz um convite para
irmos visitá-lo a bordo, sempre que o desejássemos.
Quando caminhávamos pela
praia, Edwin nos fêz lembrar do grande prédio no centro da cidade, dizendo-nos
que em breve haveria uma visita dos planos superiores, e por isso grande
concentração se formaria no templo que terminava em cúpula. Gostaríamos
de ir com êle? Não era de forma nenhuma um ato específico de adoração a esse
visitante. Coisas como adoração não requerem esforço consciente (vêm
espontaneamente do coração) mas o nosso visitante traria consigo não só sua
própria radiação, como a radiação das esferas celestiais que êle honrava.
Imediatamente expressamos o desejo de acompanhar Edwin, visto que não nos
aventuraríamos a ir sós; e além disso estávamos sob a direção do nosso amigo.
Ao longo da larga avenida
arborizada, notamos que fazíamos parte de um grande número de pessoas que caminhavam
numa mesma direção e aparentemente com as mesmas intenções. É estranho, mas não
havia a confusão própria das grandes aglomerações terrenas. Era uma sensação
extraordinária, que Rute compartilhava comigo. Temíamos o costumeiro empurrar
e acotovelar das multidões na terra, mas logo caímos em nós e nos rimos de que
pudéssemos ter tido aqui tal idéia, por um momento sequer. Sentimos que tudo
estava em perfeita ordem, que todos sabiam o que fazer e aonde ir. Sentimos que
nos aguardavam, pelo apoio que lhes daríamos, e que boas-vindas pessoais nos
esperavam. Não era isto suficiente para afastar toda sensação de inquietação e
desconforto?
Havia, além disso, uma
unidade de pensamento entre nós, que não é possível na terra, mesmo entre
aqueles que têm as mesmas crenças religiosas. Que religião existe em que todos
os adeptos são inteiramente da mesma opinião? Nenhuma. Acha-se essencial na
terra que, para dar graças ao Ente
Supremo, ou para adorá-lo, deve haver um ritual complexo,
formulários
e cerimônias dos quais há tanta diversidade de
opiniões,
quantas são as religiões.
Aqui temos templos onde podemos receber os grandes mensageiros dos reinos superiores, lugares apropriados para
receber os representantes do nosso Pai, e de onde esses mensageiros podem enviar graças e petições à Grande Nascente
de tudo. Não adoramos cegamente como na terra.
Ao aproximarmo-nos do templo já podíamos nos sentir
carregados
de força espiritual. Edwin nos contou que isso
acontecia
sempre, porque o imenso poder trazido pelos altos
visitantes
permanecia intato dentro de um amplo círculo ao redor do templo. Era por esta razão que êle se achava isolado, sem outras construções nas proximidades. Apenas
jardins o rodeavam — um mar de flores, estendendo-se a perder de vista, e apresentando tal abundância de cores
brilhantes,
como a terra jamais pôde ver. E de tudo emanavam os mais celestiais sons de música e os mais delicados
perfumes,
cujo efeito era a mais pura exaltação de espírito.
Sentimo-nos
elevados acima de nós mesmos, e num outro
mundo.
O edifício em si era magnífico e grandioso. Parecia feito do mais fino cristal, mas não era transparente. Pilares maciços brilhavam ao sol, ao mesmo tempo que as esculturas
cintilantes
espargiam por toda parte miríades de reflexos
brilhantes.
Nunca julguei possível haver semelhantes brilhos,
porque as superfícies polidas não só refletiam a luz comum, mas emanava delas também uma luz espiritual.
Edwin conduziu-nos aos lugares que deviam ser nossos, e que já nos pareciam familiares, como alguma poltrona
predileta
em nosso lar.
Acima de nós erguia-se a cúpula enorme, de ouro, maravilhosamente trabalhada, que refletia as cores das outras partes do edifício. Mas o foco das atenções era o santuário de mármore — palavra que uso, na falta de melhor — no fim
do templo. Tinha um balaustrada baixa com uma saída
central no topo de uma escada que conduzia ao solo. Podiam-se ouvir notas
musicais, mas de onde vinham, eu não sabia. Não se viam músicos, mas a melodia
era evidentemente produzida por uma grande orquestra — de cordas somente.
O santuário, que era de
dimensões espaçosas, estava repleto de seres dos planos superiores, com execção
de um espaço no centro, que eu supunha reservado ao nosso visitante. Estávamos
todos sentados, e conversava-se calmamente. Dali a pouco apercebemo-nos da
presença da majestosa figura de um homem de cabelos cor de azeviche, seguido
de perto — para grande surpresa minha — pelo bondoso egípcio que encontráramos
na casa de Edwin. Para aqueles que já haviam testemunhado tais visitas, a
chegada de ambos foi a indicação da vinda da alta personalidade, e portanto
todos se puseram de pé. Então, perante nossos olhos, apareceu primeiro uma luz,
que poderíamos dizer ofuscante; mas, concentrando o olhar, imediatamente nos
acostumamos a ela, sem sentir desconforto. Na verdade, como descobri mais
tarde, a luz é que se adaptava a nós, isto é, diminuía de intensidade de acordo
com nosso reino. Nas extremidades era quase dourada, tornando-se mais brilhante
à medida que se aproximava do centro. E no meio, vagarosamente, ela tomou a
forma do nosso visitante. Ao ganhar corpo podíamos ver que era um homem de aparência
jovem, — juventude espiritual —
mas sabíamos que ele arcava com os três atributos de
Sabedoria, Conhecimento e Pureza. Seu semblante irradiava transcendente
beleza, os cabelos eram dourados, e em torno de sua cabeça brilhava um diadema
de luz. Suas vestimentas eram da mais diáfana qualidade, e consistia em alva
túnica bordada com uma larga barra dourada, enquanto dos ombros caía um manto
de azul cerúleo, preso no peito por uma grande pérola rósea. Seus movimentos
eram majestosos ao erguer os braços para nos abençoar. Permanecemos de pé e
silenciosos, enquanto nossos pensamentos se elevavam para Aquele que nos
enviava tão maravilhoso ser. Enviamos graças
e petições. Para mim, eu tinha um pedido a fazer, e
fi-lo.
Não me é possível descrever a
exaltação de espírito que eu sentia na presença, embora distante, daquele nosso
hóspede. Não sei quanto tempo eu pude permanecer naquele templo sem sentir a
esmagadora consciência de que eu era muito, muito ínfimo, na escala da evolução
espiritual. E no entanto eu sabia que êle me enviava, como a todos, pensamentos
de encorajamento, de boa esperança, de bondade no mais alto grau, o que me fêz
sentir que nunca devia desesperar de atingir o reino espiritual mais elevado,
e que havia útil trabalho para eu prestar aos homens.
Com uma bênção final aquele
resplendente ser desapareceu de nossas vistas.
Permanecemos sentados um
pouco, e gradualmente o templo começou a esvaziar-se. Eu não sentia vontade de
me mover e Edwin disse que podíamos ficar quanto quiséssemos. O recinto estava,
portanto, quase vazio, quando vi o egípcio se aproximar de nós.
Cumprimentou-nos efusivamente e pediu-me para o acompanhar, visto que me queria
apresentar ao seu Mestre. Agradeci-lhe o interesse, e qual não foi o meu
espanto quando me conduziu à presença do homem com quem estava no santuário. Só
o vira de meu lugar, mas perto dele podia admirar um par de olhos negros
coruscantes que combinavam com seus cabelos, e que eram mais acentuados pelo
contraste com a palidez de sua cútis. As cores de sua vestimenta eram azul,
branco e ouro, e apesar de serem de qualidade superior, não tinham a
intensidade das do visitante principal. Tive a impressão de estar na presença
de um homem muito sábio, o que era verdade, e também de grande senso de humor. É
preciso nunca se esquecer de que graça e humor não são, e nunca serão,
prerrogativa dos habitantes da terra, embora muitos queiram reclamar para si o
seu monopólio, e negar nossa alegria jovial. Continuaremos a rir, a despeito da
possível desaprovação deles.)
O amável egípcio
apresentou-me a seu mestre, e este me tomou a mão e sorriu de tal maneira que
afastou de mim, completamente, qualquer acanhamento. Na verdade êle irradiava
autoconfiança e nos deixava inteiramente à vontade. Podia-se chamá-lo, sem desrespeito,
de perfeito anfitrião. Quando me falou, sua voz era agradàvelmente modulada e
suave. Suas palavras me encheram de alegria e ao mesmo tempo de espanto: —
"Meu bem-amado Mestre, que acabais de ver, me manda dizer que vossa oração
foi atendida, e vossos desejos realizados. Não temais, porque aqui as promessas
feitas são sempre cumpridas". Disse-me então que me seria pedido um certo
tempo de espera, porque era necessário que uma corrente de acontecimentos
tivesse lugar antes de as exatas circunstâncias serem realizadas. O tempo logo
passaria, e enquanto isso eu podia continuar meu trabalho com os amigos. Se
alguma vez desejasse conselhos, meu bom amigo Edwin poderia visitar o amigo
egípcio, cujas orientações estariam ao meu dispor. Deu-me, então, sua bênção, e
achei-me sozinho, só com meus pensamentos, e com a recordação duradoura da
fragrância celestial do nosso resplendente visitante.
Reuni-me a Rute e Edwin, a
quem contei da minha felicidade. Ambos rejubilaram-se às minhas boas notícias.
Sentia agora vontade de voltar à minha casa, e perguntei a eles se me
acompanhariam. Para lá nos dirigimos, e fomos diretos à biblioteca. Numa das
prateleiras havia um livro especial que eu escrevera ainda na terra, e que
desejaria nunca ter escrito. Removi o volume da prateleira, deixando o espaço
vazio. De acordo com a minha oração eu deveria preencher aquele espaço com
outro livro, escrito depois de ser espírito, o produto de minha mente após ter
visto a verdade.
De braços dados, caminhamos
para o ensolarado jardim — e para o celestial sol da eternidade.
SEGUNDA
PARTE
UM MUNDO
DESCONHECIDO
I. As Flores
Depois de ter passado a
espírito, uma das minhas primeiras experiências foi a consciência de uma
sensação de tristeza, não minha, porque me sentia supinamente feliz, mas dos
outros, e ficava intrigado por saber de onde provinha.
Edwin me contou que essa
tristeza se elevava do mundo terreno, e era causada pela dor do meu passamento.
Logo cessou, entretanto, e ele me informou que o esquecimento já principiava a
chegar. Esta experiência só, meu bom amigo, é de molde a produzir sentimentos
de humildade, se não existia antes.
Eu, asseguro-lhes, dava pouca
importância à popularidade. A descoberta, portanto, de que a minha memória se
apagava rapidamente das mentes de pessoas da terra, não me magoou nem um pouco.
Eu havia escrito e pregado para que fizessem o bem, e esse, via agora, era
microscópico. Disseram-me que muitas pessoas que estavam nas graças do público
quando vivas, descobriram, quando se desfizeram de seus corpos, que a fama e o
prestígio não os acompanharam ao mundo espiritual. Desaparecera a admiração que
havia sido sua experiência diária.
Naturalmente que entristecera
essas pessoas o deixar para
trás sua importância e isso dava-lhes uma sensação de solidão, tanto mais que,
além disso, o mundo rapidamente se esquecia delas.
Minha própria reputação
terrena não fora muito grande, mas conseguira certa posição entre meus
correligionários.
Minha transição fora calma e
pacífica, e sem circunstâncias inesperadas. Não foi um golpe ter que deixar o
mundo. Não tivera ligações a não ser com meu trabalho. Edwin me falou a
respeito de outros cuja morte foi extremamente infeliz, e cujo estado espiritual à
chegada aqui era mais infeliz ainda. Muitos, que eram grandes na terra, se
acharam diminuídos em
espírito. E muitos, desconhecidos na terra, aqui se viram
espiritualmente tão famosos que ficaram estupefatos. Não são todos, de maneira
nenhuma, que estão destinados aos belos reinos do sol e verão eternos.
Já lhes dei uma idéia dos
reinos da obscuridade e semi-obscuridade, onde tudo é árido e triste, onde
habitam as almas que podem se elevar acima das trevas, se assim o desejarem e
lutarem. Existem muitos que passam sua eternidade visitando essas obscuras regiões,
para tentar arrancar esses infelizes à sua miséria, e pô-los no caminho da luz
e do progresso espiritual.
É meu privilégio ir com Edwin
e Rute a essas regiões além da névoa que as separa da luz. Não tenho a intenção
de os levar ainda a essas regiões de miséria e infelicidade. Mais tarde espero
contar-lhes algumas das minhas experiências. Por enquanto há outros e mais
agradáveis assuntos de que prefiro falar.
Há muitas almas no plano
terrestre que tentam aprofundar os inúmeros mistérios da vida. Propõem teorias
das mais diversas, tentando explicar isso ou aquilo, teorias que com o correr
do tempo podem vir a constituir grandes verdades. Algumas dessas hipóteses são
tão remotas da verdade como é possível imaginar, outras, são meramente tolices.
Mas há também pessoas que recusam pensar por si sós e que firmemente mantêm a
crença de que enquanto são encarnadas não
precisam saber coisa alguma
da vida que está à sua espera. Afirmam que não é intenção de Deus que saibam
tais coisas, e que quando chegarmos a espíritos saberemos tudo.
Há dois extremos de idéias —
as dos teoristas e as dos partidários da porta fechada. Ambas as escolas recebem
duros golpes, quando entram nas terras espirituais para todo o sempre.
Indivíduos com estranhas teorias, vêem-nas demolidas pelo simples fato de
encararem agora a absoluta verdade. Descobrem que a vida no espírito não é tão
complexa como diziam. Em muitos casos é bem mais simples do que na terra,
porque não temos os problemas que constantemente preocupam e afligem os terrenos,
problemas de religião e política, por exemplo, que através dos tempos têm
causado revoluções sociais que ainda têm repercussão no mundo terreno do
momento presente.
O estudante de ciências
ocultas está arriscado a cair em erros, tanto como o estudante de assuntos
religiosos. Êle faz afirmativas tão dogmáticas quanto as que emanam da religião
ortodoxa, afirmações essas que estão bem longe da verdade.
O período em que vivi no
mundo espiritual é nada — absolutamente nada — em comparação com algumas das
grandes almas com quem tive o privilégio de falar. Mas elas mostraram-me algo
das suas vastas reservas de conhecimentos, coisas que minha mente era incapaz
de compreender. De resto, eu — assim como milhões de outros — estou perfeitamente
satisfeito em esperar pelo dia em que minha inteligência esteja
suficientemente adiantada para receber as maiores verdades.
Um assunto que causa alguma
perplexidade refere-se às flores que temos no mundo dos espíritos. Alguns
dirão: por que flores? Qual o seu significado ou fim? Têm elas alguma
significação simbólica?
Façamos a mesma pergunta aos
terrestres referente às flores que crescem na terra. Têm elas algum significado
simbólico? A resposta a ambas é Não! As flores são dadas m
à terra para auxiliar a embelezá-la e para deleite e encan-tamento
daqueles que as admiram. O fato de que elas servem outros fins úteis é mais uma razão para a sua existência.
As flores são essencialmente belas, alimentadas pelo Supremo
Criador, dadas a nós como um dom precioso, exibindo-nos
sua coloração, seus formatos, e perfumes, numa expressão
infinitesimal da Grande Mente. Vocês têm esta glória no plano terrestre. Teremos nós que .ser privados delas no mundo
espiritual
porque são consideradas terrenas ou porque nenhum significado profundo e abstruso pode ser dado à sua
existência?
Temos aqui as mais lindas flores, algumas, como as familiares e queridas da terra, outras, conhecidas apenas no mundo espiritual, mas todas são soberbas, são a alegria
perpétua daqueles a quem elas rodeiam. São criações divinas,
cada uma exalando o puro hálito espiritual e sustentadas pelo seu Criador e por nós todos, pelo amor que lhe ofertamos.
Se não as quiséssemos — suposição impossível — elas
seriam varridas da terra. E que teríamos em seu lugar? E quem forneceria a riqueza de cores que vem delas?
Quando somos apresentados pela primeira vez às flores e árvores, a toda a sua luxuriante natureza espiritual, percebemos imediatamente algo que a natureza terrena nunca
pareceu possuir, isto é, uma inteligência inerente dentro de todas as coisas que crescem. As flores terrenas, apesar de vivas, não se manifestam imediatamente quando nos pomos em contato com elas. Mas aqui é diferente. As flores espirituais são imperecíveis e isso deveria imediatamente sugerir
que há mais do que vida dentro delas. São parte da imensa
corrente de vida que flui diretamente d'Êle. Essa corrente
nunca cessa nem diminui e é, além disso, continuamente alimentada pela admiração e amor que nós, gratamente, lhes
dedicamos.
Não podemos deixar de ficar maravilhados, quando
seguramos
a mais minúscula flor entre as mãos e sentimos tamanho influxo de poder magnético, tanta força revigorante, tal
refortalecimento de todo o nosso ser, e quando ficamos sabendo,
em verdade, que essas forças reanimadoras nos vêm direta-
mente da Fonte de todos os bens. Não, não há outro
significado por detrás das flores espirituais além daquela beleza exprimida
pelo Pai do Universo, e, por certo, isso é bastante. Êle não deu nenhum
estranho simbolismo às suas criações impecáveis. Por que o faríamos nós?
A maioria das flores não se
devem apanhar. Isso é destruí-las, é destruir o contato direto com o Criador. É
possível colhê-las, certamente; nenhuma calamidade desastrosa nos advém por
isso. Mas quem quer que as apanhe certamente o lamentará profundamente. Pensem
em algum pequeno objeto que possuam e prezem acima de tudo, e pensem depois em
destruí-lo deliberadamente. Causaria extrema tristeza fazê-lo, embora a perda
pudesse ser insignificante. Tal seria sua emoção quando impensadamente
destruísse flores que não devem ser apanhadas.
Mas há flores, e muitas,
expressamente para serem colhidas, e muitos o fazem, levando-as para suas
casas como fazemos na terra, e pelas mesmas razões.
Essas flores apanhadas sobrevivem
por quanto tempo quisermos conservá-las. Quando nosso interesse por elas começa
a desvanecer, rapidamente se desintegram. Não haverá restos murchos
desagradáveis à vista, porque não pode haver morte na terra da vida eterna.
Simplesmente notamos que nossas flores desapareceram e podemos trocá-las então
por outras, se o desejarmos.
Continua no próximo Bloco - O Solo ( Como deve ser o solo no plano espirual criado por Deus?)
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