sexta-feira, 30 de agosto de 2013

A VIDA NOS MUNDOS INVISÍVEIS -BLOCO VIII

IV.  Tempo e Espaço

Julga-se em geral na terra que no mundo espiritual nem o tempo nem o espaço existem, mas isso é um erro. Temo-los ambos, mas nossa concepção sobre eles difere da terrena.
Às vezes usamos a expressão antes da aurora do tempo para dar a idéia da passagem dos eons do tempo, mas não temos idéia do que está realmente sugerido por essa frase.
No plano terrestre a medida do tempo tem sua origem na revolução do globo sobre seu eixo, dando a divisão do tempo conhecido como noite e dia. A invenção de relógios e calendários nos deu meios convenientes, de medir o tempo, ao alcance de todos.
No mundo espiritual não temos relógios ou outros en­genhos mecânicos para indicar a passagem do tempo. Seria a coisa mais simples no mundo espiritual os cientistas nos presentearem com alguns, se isso fosse necessário. Mas não é. Não temos estações, nem a alternância de luz e escuridão

como indicações externas do tempo, e além disso, não temos aqueles lembretes físicos comuns aos mortais, da fome e sede, e fadiga, além do envelhecer do corpo. Para quê, pois, teríamos necessidade da marcação do tempo?
Temos duas concepções do tempo, uma das quais, como na terra, é puramente relativa. Cinco minutos, digamos, de agudo sofrimento sentido pelo corpo físico afetará a mente de tal maneira que os momentos passageiros parecerão uma eternidade. Mas cinco minutos de intensa alegria e felici­dade desfilarão com a rapidez de um segundo.
Aqueles dentre nós que vivem nos reinos de felicidade e verão perpétuo não terão motivo para achar que o tempo não passa.
Nos reinos sombrios acontece exatamente o contrário. O período de escuridão parecerá interminável àqueles que aí vivem. Por mais que tais almas anseiem pela vinda da luz, ela, no entanto, jamais vem. Eles é que devem dar o primeiro passo em direção à luz que os espera nos reinos mais elevados. Um período de existência dentro das regiões escuras, que não vai além de um ano ou dois do tempo terreno, parecerá uma eternidade para os sofredores.
Se, normalmente, não temos os meios usuais de medir o tempo porque não os necessitamos, podemos — e o fazemos — voltar a ter contato com a terra onde nos podemos certificar da exata hora do dia, ano, etc.
Algumas pessoas, que de outro modo não o fariam, vol­taram à terra com o simples intuito de satisfazer sua curio­sidade quanto ao número de anos que haviam estado no mundo espiritual. Falei com alguns que fizeram esta jornada, e todos ficavam atônitos ao descobrir os muitos anos que se passaram desde sua transição.
Falando por mim, eu achei que o tempo passava rapi­damente, mas sempre soube, através de todo esse período, qual era o ano da Era Cristã. Em meu caso a razão era que me fora prometido um dia me comunicar com o mundo terreno. Tinha, portanto, observado com agudo interesse, a concatenação dos eventos que conduziriam, entre outras coisas, à realização do meu desejo.
Edwin, que me recebeu no limiar do mundo espiritual, e me conduziu ao meu novo lar, também estava ao corrente do passar dos anos, porque êle, por seu lado, estivera me observando.
Poder-se-á julgar que o tempo não tem muita influência além do mundo terrestre, mas isso não é bem verdade.
Todos os acontecimentos terrestres referentes a indivíduos ou nações estão sujeitos ou governados pelo tempo. E no ponto em que esses eventos atingem o mundo espiritual, nós no espírito também sofremos a influência do tempo. To­memos a festa do Natal como o exemplo mais fácil. Cele­bramos esta festividade ao mesmo tempo que na terra. Se o dia 25 de dezembro é a data correta historicamente, isso não vem ao caso. O que importa é que as duas celebrações, a vossa e a nossa, são sincronizadas e periódicas.
Em tempos .normais na terra, essa época do ano dá lugar a uma grande onda de bondade e boa vontade. Muitas pessoas, esquecidas em outras ocasiões, lembram-se § de seus amigos e parentes já falecidos e lhes enviam pensamentos que nós no espírito ficamos felizes de receber e retribuir. A celebração do Natal é sempre precedida por pensamentos de agradável antecipação. Se nada mais houvesse para nos guiar, eles apenas seriam suficientes para nos lembrar que a época festiva se aproxima.
Este exemplo particular do Natal mostra que não depen­demos inteiramente do plano terrestre para sabermos da apro­ximação das festividades. Nestas ocasiões somos sempre visi­tados por grandes almas, e se falhassem todos os outros meios, este seria infalível para indicar a passagem do tempo.
Os que estão em constante contato com a terra conhecem é claro, o dia, mês e ano em que estamos. Sabemos também as horas exatas. Não há dificuldades nem mistérios. Quando descemos às vossas condições podemos fazer uso dos muitos meios empregados por vós — e o que pode ser mais simples? — Não precisamos, porém, como regra, estar constantemente atentos ao dia e hora exatos, ou então tomar conhecimento deles. Quando cooperamos ativamente convosco, os vossos pensamentos em direção a nós são indicação suficiente de que decorreu um certo momento, enquanto nos pusemos a tra­balhar ou conversar. Tais pensamentos são tudo de que necessitamos. É na natureza comum das coisas em espírito que, falando de maneira geral, podemos perder todo sentido de continuidade temporal, nos espaços medidos como co-nheceis. Deixamos que tudo permaneça assim até que tenhamos de fazer algo que exija atitude diferente. Quando anteci­pamos a chegada de algum parente ou amigo ao mundo espiritual, é para o evento que lançamos o pensamento, e não para o ano em que ele vai ocorrer.
Cito-vos aqui simples fatos do conhecimento derivado da minha própria experiência, e o que falei, portanto, deveis aplicar estritamente ao reino em que vivo.
Dos reinos superiores nada conheço diretamente, e o cabedal de informações que recolhi das conversas com os seus habitantes tem sido governado e limitado pela minha capacidade de compreensão. Tudo o que posso dizer, pois, sobre o tempo nas esferas superiores é que nesses elevados estados atingimos reinos onde o conhecimento, entre muitos outros atributos, é de uma ordem muito mais elevada. Os personagens desses reinos é que me espantam mais com a exatidão de sua previsão de acontecimentos que têm lugar no plano terrestre. Seus métodos para adquirir essas infor­mações estão além de nossa compreensão. É suficiente lembrar que isso é assim mesmo, e que o tempo, em conse­qüência, não é limitado aos reinos de um não menos exal­tado estado de progresso espiritual.
Quando chegamos ao assunto sobre o espaço descobrimos que, geralmente falando, nós somos governados, até um certo ponto, pelas mesmas leis do plano terrestre. Temos a eterni­dade do tempo, e temos também a infinidade do espaço.
O espaço deve existir no mundo espiritual. Tomemos meu reino por exemplo. De pé à janela de um dos aposentos do andar de cima, eu podia alongar a vista por distâncias infindas onde se espalham casas e imponentes edifícios. À distância eu podia ver a cidade com muito mais prédios. Espalhados por todo o amplo panorama há bosques, vales, rios, jardins, e pomares, e todos eles ocupam espaço, exata­mente como na terra. Cada um preenche o seu espaço re­servado. E eu sei, ao olhar da minha janela, que além do alcance da minha vista, muito além ainda, há mais e mais reinos que constituem a infinidade de espaço. Sei que posso viajar ininterruptamente através de enormes áreas de espaço, áreas muito maiores do que o mundo terrestre triplicado,* ou ainda maiores. Eu ainda não atravessei senão uma fração da extensão completa do meu reino, mas posso fazê-lo quando bem o entender. Disseram-me os amigos dos reinos superiores que eu poderia mesmo ir àqueles es­tados, se o desejasse. Ser-me-iam dadas facilidades e o manto protetor necessários para tal jornada, de maneira que, poten­cialmente, meu campo de movimento é gigantesco.
Olhado por olhos terrenos somente, essa imensa região estaria, é claro, fora do alcance da maioria das pessoas, visto que o movimento através de tais distâncias na terra, seria dependente dos meios de transporte, assim como de outros fatores. Mil milhas de espaço terrestre é uma distância bem considerável, e requer muito tempo se meios de transporte mais vagarosos são usados. Mesmo pelo mais rápido método, um certo tempo deve passar antes de se chegar ao término dessa jornada de mil milhas. Mas no mundo espiritual o pensamento altera toda a situação. Temos espaço, e temos certo conhecimento do tempo em relação a ele. O pensamento pode anular o tempo em sua relação com o espaço, mas não pode anular o espaço.
Posso estar em minha casa e imaginar que gostaria de ir à biblioteca na cidade que diviso a milhas de distância. Nem bem a idéia passou com precisão pela minha mente e eu já me acho — se o desejar — perante as estantes que desejo consultar. Fiz o meu corpo espiritual — e esse é o único que possuo! — viajar através do espaço com a rapidez do pensamento, e isso eqüivale a ser instantâneo. E que fiz eu? Cobri o espaço intermediário instantaneamente, mas êle ainda aí permanece com todas as coisas que contém, apesar de eu não tomar conhecimento do tempo ou da pas­sagem do tempo.
Quando completei a minha visita à biblioteca encontrei na escadaria alguns amigos que sugeriram irmos até à casa de um deles. Com essa agradável idéia em mente, decidimos passear através dos jardins e bosques. A casa fica a certa distância, mas isso não importa, porque nunca sofremos de fadiga física. Caminhamos juntos, conversando, felizes, e depois de um certo tempo chegamos à casa do meu amigo, depois de percorrer o caminho a pé. O tempo — em seu sen­tido espiritual — e o espaço são relativos, como também o são no mundo terrestre. Mas a nossa concepção deles difere da vossa — sendo que esta é restringida pelas considerações terrenas do amanhecer e anoitecer, e pelos vários modos de transitar. Nós aqui temos o dia interminável, e podemos caminhar vagarosamente a pé ou transportarmo-nos instan­taneamente pelo pensamento. No mundo espiritual o tempo pode parar. E podemos restaurar nossa sensação de tempo descansando calmamente ou caminhando. Mas quando rece­bemos os vossos pensamentos do mundo, dizendo-nos que estais prontos para vir a nós, uma vez mais ficamos cientes da passagem do tempo terrestre.
E deveis admitir que invariavelmente somos pontuais em nossos encontros com os seres terrestres!



V.  Posição Geográfica


Qual é a posição geográfica do mundo espiritual em relação ao mundo terrestre? Muita gente perguntou isso em diferentes épocas — e eu me incluo entre esses muitos!

Isso leva a mais uma questão referente à disposição de outros reinos além daqueles de que escrevi acima.
Já disse como, ao chegar ao ponto crítico em que jazia em meu leito de morte, senti por fim um desejo ardente de me erguer e, ao ceder a esse desejo fi-lo facilmente e com sucesso. Nesse caso particular a linha de demarcação era muito tênue entre a minha vida terrena e o começo da espi­ritual, porque eu estava de pleno poder dos meus sentidos, e consciente. A própria transição de um mundo para o outro era perceptível. Mas posso resumir mais ainda, relembrando que houve um momento em que as sensações físicas de minha ultima doença me deixaram subitamente, e em lugar delas me envolvi numa deliciosa sensação de calma corporal e paz de espírito. Senti vontade de respirar profundamente e o fiz. O impulso de erguer-me do leito, e o desaparecimento de todas as sensações físicas, marcaram o instante da morte física e o nascimento para a vida espiritual.
Mas quando isso se deu, eu ainda estava em meu quarto na terra, e, portanto, parte pelo menos do mundo espiritual teve de interpenetrar o mundo terrestre. Esta experiência vos dará um ponto de partida para nossas explorações geo­gráficas.
O evento seguinte da minha transição, foi a chegada de meu bom amigo Edwin e o nosso encontro depois de um bom número de anos. O encontro teve lugar aparentemente em meu quarto. Depois de nos termos cumprimentado e proseado por algum tempo, Edwin propôs que partíssemos do atual ambiente, que, nessas circunstâncias, era ligeiramente tristonho. Pegou-me pelo braço, ordenou-me que fechasse os olhos, e senti-me mover suavemente através do espaço. Não tive percepção clara da direção, apenas senti que estava via­jando, mas se era para baixo, para cima ou horizontalmente, impossível dizer. Nossa velocidade aumentou e finalmente me ordenaram que abrisse os olhos e achei-me diante do meu lar espiritual.
Desde aquele dia aprendi muitas coisas, e uma das pri­meiras lições foi a arte de locomoção própria por outros meios sem ser o andar.   Há aqui imensas distâncias a per­correr e às vezes precisamos cobri-las rapidamente, e o fa­zemos pelo poder do pensamento que já descrevi.   Mas o que mais me intrigou a princípio, foi o fato de que quando me movia através do espaço, com maior velocidade do que o andar, descobri que não tinha senso de direção, mas apenas de movimento.   Se prefiria fechar os olhos enquanto viajava com velocidade moderada, eu apenas não via a paisagem, ou o que quer que seja que me rodeasse. Não se deve imaginar que é possível perder-se o caminho.   Isso seria absurdo!   A ausência do senso de direção não interfere em absoluto com o nosso pensamento inicial de locomoção.   Uma vez deter­minada a viagem para um certo lugar, pomos nossos pensa­mentos em função e eles, por sua vez, põem nossos corpos espirituais em movimentos.   Podia-se quase dizer que não se precisa pensar! Já falei com outras pessoas a esse respeito e comparamos nossas notas, o que é comum logo que se chega aqui.   Descobri que é normal a todos essa ausência de percepção direcional quando nos movemos rapidamente. É evidente que quando viajamos instantaneamente, não há tempo para se observar qualquer objeto.
Notemos que dar uma precisa localização ao mundo espiritual em relação ao terreno é muito difícil. Na verdade, duvido que algum recém-chegado aqui tenha arris­cado adivinhar sua posição geográfica. Mas há centenas de pessoas que nem se preocupam com tal coisa. Quebraram todos os liames com o mundo terreno e sabem apenas que estão vivos espiritualmente, mas quanto à posição em que se acham no universo, nem se dão ao trabalho de imaginar. Mas nosso caso é diferente. Eu estou em ativa comunicação com a terra, e creio que seria de interesse tentar dar uma idéia exata onde estão situadas as terras espirituais.
O mundo espiritual está dividido em esferas ou reinos. Essas duas palavras passaram a ser correntes entre a maioria daqueles que na terra conhecem e praticam a comunicação com o nosso mundo. Ao falar-vos assim, usei as palavras acima, suficientes para o nosso fim.

A essas esferas foram dados números, por alguns estu­dantes, e vão desde o primeiro, que é o mais baixo, até o sétimo, que é o mais alto. Ê costume entre nós seguir este sistema de numeração. A idéia, segundo me disseram, teve origem aqui entre nós, e é um método conveniente de dar informações de nossa posição na escada da evolução espi­ritual.
As esferas do mundo do espírito estão colocadas numa série de zonas formando um número de círculos concêntricos à volta da terra. Esses círculos alcançam o espaço infinito e estão invislvelmente ligados com o mundo terrestre na sua evolução menor sobre seu eixo, e é claro, em maior revolução à volta do sol. O sol não tem qualquer influência sobre o mundo espiritual. Não tomamos conhecimento dele, visto que é puramente material.
Um exemplo de círculos concêntricos nos é dado quando nos dizem que um visitante de uma esfera mais elevada vai descer a nós. Ele está relativamente acima de nós, tanto espiritual como espacialmente.
Os reinos inferiores da escuridão estão situados perto da terra, e penetram na sua parte mais baixa. Foi através desta que passei com Edwin quando êle me veio buscar para o meu lar espiritual, e foi por essa razão que me recomendou mantivesse os olhos fechados até que me ordenasse abri-los. Eu estava suficientemente alerta até mesmo demais, porque estava plenamente consciente ou teria visto algo dos hor­rores que a terra lançou a essas zonas escuras.
Sendo o mundo espiritual constituído de círculos concên­tricos, e com a terra aproximadamente no centro, as esferas são subdivididas lateralmente para se corresponde­rem largamente com as várias nações da terra, cada sub­divisão estando situada imediatamente sobre sua nação irmã. Quando se considera a enorme variedade de temperamentos nacionais e características distribuídas através do plano ter­restre, não é de surpreender que os povos de cada nação desejem gravitar para aqueles de sua própria espécie no mundo espiritual; a escolha individual, é claro, é livre e         B
aberta para todas as almas: elas podem viver em qualquer

parte que lhes agrade de seu próprio reino. Não há fronteiras                     1

territoriais físicas aqui para separar as nações. Os povos fazem

suas próprias fronteiras invisíveis com temperamentos e cos-
tumes, mas os membros de todas as nações da terra têm
liberdade de se misturar no mundo espiritual e de gozar                               i

      relações sociais irrestritas.  A questão da linguagem não oferece dificuldade porque não somos obrigados a falar alto. Podemos
      transmitir nossos pensamentos uns aos outros com a inteira
certeza de que eles serão recebidos pela pessoa a quem nos                           1
      dirigimos mentalmente.  Assim, as línguas não constituem
barreiras.                                                                                                                       1
Cada uma das subdivisões nacionais do mundo espiritual
leva as características de sua réplica terrena. Mas isso é
natural.   Meu próprio lar está situado em cercanias que me                                                                                                                                         1
são familiares e que são uma cópia de meu lar terreno na                                                                                                                                          §
aparência geral.   As redondezas não são uma réplica exata das da terra, mas o que quero dizer é que meu lar espiritual      está localizado no tipo de campo com o qual eu e meus amigos
estamos acostumados.                                                                                                j
                Esta divisão das nações se estende apenas a um certo
número de reinos.    Além deles a nacionalidade cessa de
 existir. Lá retemos apenas nossas diferenças exteriores e visíveis, tais como a côr da pele, seja ela amarela, negra ou branca. Deixamos de ser cônscios da nacionalidade como somos na terra.   Nossos lares não têm mais uma aparência
   nacional definida, mas partilham do espírito puro.
               Deveis recordar-vos como, ao construir o anexo da biblio-
teca, eu vos apresentei o governante do reino. Cada reino tem tal personagem, apesar do termo governante não ser apropriado, visto que dá azo a interpretações erradas.   Seria
    melhor e muito mais exato dizer que êle preside o reino.
 Apesar de cada reino ter seu governante, todos eles per­tencem a um plano mais elevado do que aquele que pre­sidem.

Esta posição requer altos atributos por parte de seu ocupante, e ela somente pode ser ocupada por aqueles que já estão há muito tempo no mundo espiritual. Grande espi­ritualidade apenas não é suficiente, se o fosse haveria muitas almas que poderiam ocupar tal cargo com distinção. Mas um governante precisa possuir muito conhecimento e expe­riência da humanidade e além disso deve ser capaz sempre de exercer sábia discrição ao lidar com os variados assuntos que se lhe deparam. E toda essa experiência e sabedoria, compreensão e simpatia estão sempre à disposição dos habi­tantes de seu reino, ao mesmo tempo que a bondade e infi­nita paciência estão sempre em evidência. Esta grande alma é sempre acessível a quem .quer que o deseje consultar ou lhe traga seus problemas para solução.
Temos os nossos problemas, como vós na terra, apesar de nossos problemas serem muito diferentes dos vossos. Os nossos nunca são daquela natureza aflitiva e preocupante dos da terra. Falando por mim mesmo, meu primeiro problema, logo depois da transição, foi como acertar o que eu consi­derava um erro que fizera quando encarnado. Havia escrito um livro em que tratava a verdade da comunicação com o mundo terreno com grande injustiça. Quando falei com Edwin a esse respeito, ele — sem eu o saber — havia procurado o conselho do reinante, e o resultado foi que outra grande alma viera discutir o assunto comigo, e oferecer-me ajuda e conselhos nessa dificuldade. Foi o conhecimento em primeira instância dos meus negócios pelo governante que eventual­mente trouxe um final feliz à minha confusão.
Pode-se ver por isso que o conhecimento do governante em relação ao povo que preside é vasto. Para que não se julgue que é humanamente impossível a uma mente possuir conhecimento dos afazeres de tanta gente que deve haver em um reino, basta compreender que a mente humana é limitada em seu raio de ação pelo cérebro físico. No mundo espiritual não o temos a prejudicar-nos, e nossas mentes são inteira e completamente capazes de reter todo conhecimento que nos vem. Não esquecemos as coisas que se aprendem no mundo espiritual, sejam elas lições espirituais ou simples fatos. Mas leva tempo, como se costuma dizer, a aprender, e é por isso que os governantes passam muitos e muitos milhares de anos no mundo espiritual, antes de serem colocados à testa do governo. Porque os governantes têm que guiar e dirigir os povos, e ajudá-los em seu trabalho, e unir-se a eles nas horas de recreação, ser-lhes uma inspiração e agir sob todos os sentidos como um devotado pai. Não há infelicidade nestes planos, pela simples razão de que seria impossível, com tais almas aqui prontas a afastar todos os percalços.
Cada esfera é completamente invisível a todos os habi­tantes das suas inferiores, e isso pelo menos é que forma os nossos limites.
Quando viajamos .para os planos inferiores vemos o ter­reno gradualmente degenerar. Mas ao aproximarmo-nos dos reinos mais elevados acontece o oposto: vê-se a terra à nossa volta tornar-se mais etérea, mais pura, e isso forma uma barreira natural para aqueles entre nós que ainda não progrediram suficientemente para se tornarem habitantes desse reino.
Ora, eu já contei como os reinos se colocam, uns acima dos outros. Como, então, se passa de um para o outro, seja acima ou abaixo? Deve haver algum ou alguns pontos em cada reino onde exista uma sensível inclinação para um, e um distinto declive para o outro. Apesar de parecer simples, é esse exatamente o caso.
Não é difícil imaginar talvez uma gradual descida a regiões menos salubres. Podemos lembrar nossas experiências terrenas e certos lugares rochosos que visitamos, de piso traiçoeiro, conduzindo a escuras cavernas, frias, úmidas, e pouco convidativas, onde podíamos imaginar toda espécie de coisas horríveis nos aguardando na escuridão. Podemos então lembrar que acima de nós, apesar de longe da vista, brilha o sol, espalhando calor e luz sobre a terra, enquanto que nós

parecemos estar completamente em outro mundo. Pode­remos vaguear por essas grutas subterrâneas até nos perdermos da terra acima de nós. Mas sabemos que há uma saída pelo menos, se a pudermos achar e perseverarmos em nossos es­forços para escalar o perigoso caminho.
Se começamos nossa vida espiritual nos mais baixos re­cessos deste quadro terreno das cavernas subterrâneas, po­demos ver como cada um dos reinos é ligado com o reino imediatamente acima dele.
A analogia terrena é, logicamente, muito elementar, mas o processo e o princípio são os mesmos. No espírito, a transição de um reino para o outro é literal — tão literal quanto o passar de uma caverna escura para o sol lá em cima, tão literal quanto caminhar de um aposento para outro em sua casa.
Para passar do reino onde estou ao próximo mais elevado, me acharei andando suavemente ao longo de um chão em aclive. Ao adiantar-me verei e sentirei todos os inconfun­díveis sinais de um reino de maior refinamento espiritual. Chegará o ponto em que não poderei avançar mais sem des­conforto espiritual. Se cometesse a tolice de tentar desafiar essa lei, descobriria no fim que não poderia dar nem mais um passo sem passar por sensações que não me seria possível suportar. Nada poderia ver à minha frente, somente atrás. Mas estejamos nós num desses limites ou bem dentro dos nossos limites, há um certo trecho na ponte entre os reinos onde o reino mais alto se torna invisível a olhos menos espirituais. Assim como certos raios de luz são invisíveis a olhos terrenos, e certos sons e notas musicais são inaudíveis a ouvidos mortais, assim também os reinos mais elevados são invisíveis aos habitantes inferiores.
E a razão é que cada reino possui uma vibração de maior intensidade do que o seu inferior, e é portanto invisível e inaudível aos que vivem abaixo.
Vemos assim que outra lei natural opera para o nosso próprio bem.


Há uma belíssima e brilhante esfera no mundo espiritual, a que foi dado o título pitoresco de Verão Eterno.
As regiões escuras podem ser chamadas de Inverno Eterno, a não ser pelo fato de que o inverno terreno possui uma grandiosidade toda sua; enquanto que tudo é abominável nas camadas inferiores do mundo espiritual.
Até aqui mencionei apenas de leve essas regiões, levando--vos apenas ao seu limiar; mas com Edwin e Rute já cheguei a penetrar profundamente nelas.
Não é assunto agradável, mas me foi aconselhado que se devem apresentar os fatos não com intenção de assustar as pessoas — não é esse o método nem o alvo do mundo espiritual — mas para mostrar que tais lugares existem unicamente pela virtude de uma lei inexorável, a lei da causa e efeito, a colheita espiritual que procede da sementeira terrena; para mostrar que escapar à justiça no mundo é o mesmo que achar justiça estrita e impiedosa no mundo espiritual.
Ao caminharmos lentamente de nossos próprios reinos para aquelas terras sombrias, acharemos uma gradual dete­rioração surgir na paisagem. As flores escasseiam e são sub­nutridas, dando a aparência de que lutam pela existência. A grama é ressequida e amarela até que finalmente desa­parece por completo para ser substituída por áridas rochas. A luz diminui continuamente até ficarmos em terras cinzentas e vem então a escuridão — profunda, negra e impenetrável; mas impenetrável apenas para os que são espiritualmente cegos. Visitantes de planos superiores podem ver nessa obs-curidade sem serem vistos pelos habitantes, a não ser que seja vitalmente necessário revelar sua presença.
Nossas visitas nos levaram ao que creio ser o mais ínfimo plano da existência humana.
Começamos a descida passando através de um cinturão de névoa no trecho onde o solo se tornou árido e duro.   A

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luz diminuiu rapidamente e as moradias eram cada vez mais raras, e não se via vivalma. Grandes trechos de rochas se estendiam à nossa frente e a estrada que seguíamos era rude e cheia de precipícios. Agora a escuridão já nos en­volvia, mas podíamos ver ainda nosso ambiente perfeitamente. É uma experiência bem estranha esta de enxergar no escuro, e quando se passa por ela pela primeira vez sentimos um ar de irrealidade, mas na verdade é bem real.
Ao descermos pelas rochas eu podia sentir e ver o limo horrível que cobria a sua superfície, de côr verde e mal­cheirosa. Não havia, é claro, perigo de cairmos. Isso seria impossível a qualquer dos habitantes desses lugares.
Depois de viajarmos sempre para baixo pelo que me pareceu um longo tempo — calculo que deve ter sido uma milha pelas medidas terrestres — achamo-nos numa cratera gigantesca de muitas milhas de circunferência, cujos lados ameaçadores e traiçoeiros se erguiam bem alto acima de nós.
Toda a área era pontilhada de imensas rochas, como se alguma enorme avalanche ou cataclismo as tivesse arrancado da borda superior e atirado às profundezas, para lá se espa­lharem formando cavernas e túneis.
Em nossa atual posição estávamos bem acima desse mar de rochas e podíamos ver surgir delas uma nuvem sombria de vapor venenoso, como um vulcão a ponto de entrar em erupção. Não estivéssemos nós bem protegidos e sua ema­nação nos seria sufocante e mortal. Como estávamos, sen-tíamo-nos perfeitamente a salvo, mas podíamos perceber com nossas faculdades intuitivas o grau de malignidade do ambiente. Vagamente, pudemos ver através do miasma, o que parecia serem seres humanos, rastejando como animais pela superfície das rochas. Não podíamos crer fossem pessoas, mas Edwin nos assegurou que um dia já foram homens na terra, andando, respirando e caminhando como nós. | Mas viveram uma vida de impureza espiritual e pela morte física, haviam passado à sua verdadeira habitação, de acordo com seu estado de es­pírito.
O vapor ascendente parecia envolvê-los numa mortalha que os escondia um pouco aos nossos olhos.
Como eu havia expressado o desejo de ser levado por Edwin aonde quer que êle achasse de bom proveito para os meus fins, e como eu sabia que seria capaz de suportar quaisquer visões, aproximamo-nos de algumas dessas cria­turas de horror. Rute nos acompanhava e, não é necessário dizê-lo, nunca lhe seria permitido fazê-lo se não fosse do conhecimento geral que ela estava apta a enfrentar os aspectos mais horrendos com coragem e autodomínio. Na verdade, fiquei admirado da sua atitude e até reconhecido por ter sua companhia.
Aproximamo-nos de uma das formas sub-humanas que jazia sobre umas das rochas. O que restava de suas roupas podia ser facilmente dispensado, visto que consistia apenas de imundos trapos, através de cujos rasgões se via a carne com aparência inanimada. Os membros eram tão magros que se esperava que a pele se rasgasse sobre os ossos salientes. Mãos em formato de garras de aves de rapina mostravam unhas incrivelmente crescidas. A face desse monstro nem era hu­mana, tão deformada e horrível. Os olhos eram pequenos e penetrantes, mas a boca era, ao contrário, enorme e repugnante, com grossos lábios que salientavam o queixo prognático, e mal escondiam dentes quase caninos.
Fitamos longamente esse destroço humano, e imaginamos que ações terrenas o haviam reduzido a esse estado de dege-neração.
.. Edwin, experimentado em tais espetáculos, nos disse que com o tempo ganharíamos prática em nossos trabalhos e poderíamos ler nos rostos e formas dessas criaturas o que as havia transformado em frangalhos. Não haveria neces­sidade de abordá-las para decifrar a história de sua vida por­que ela estava gravada em seus semblantes. A aparência também nos avisaria se necessitavam auxílio ou se estavam satisfeitos com o presente estado de coisas.
Continua

O objeto que agora contemplávamos, disse Edwin, não valia a nossa simpatia, pois que estava ainda imerso em sua iniqüidade, e obviamente não mostrava o menor sinal de arrependimento por sua vida anterior. Estava muito eston-teado com a perda de sua energia física para compreender o que havia acontecido. Suas feições mostravam que, dada a oportunidade, êle continuaria as práticas infames que aqui o haviam lançado. Que já estava há várias centenas de anos no mundo espiritual, podia-se ver pelos restos esfarrapados de sua roupa que indicava pertencer a eras passadas. Cada crime cometido contra outros tinha revertido contra êle, e enfrentava agora, como já o vinha fazendo há centenas de anos, a recordação indelével de todos os males que perpe­trara contra seus semelhantes. Quando na terra, usara de falsos argumentos para administrar a justiça, mas essa nada mais fora que uma paródia, e agora é que êle estava vendo o que é de fato a verdadeira justiça. Não só encarava conti­nuamente a sua vida passada de maldades, mas as feições de suas inúmeras vítimas estavam sempre perante seus olhos. Nunca poderá esquecer; terá sempre que recordar. E sua condição é agravada pela raiva de se sentir como animal numa jaula.
Nosso grupo de três não conseguia sentir o menor ves­tígio de pena por esse monstro desumano. Êle recebia sua paga, nada mais nada menos. Êle se julgara, se condenara, e agora sofria o castigo que merecia e que quisera. Aqui não havia o caso de um Deus vingador infringindo castigo sobre um pecador. Este, ali estava de fato, mas era a manifestação visível das causas e efeitos. A causa era sua vida terrena e o efeito, sua vida espiritual.
Tivéssemos vislumbrado o menor raio de luz — aquela luz verdadeira que se vê — que é um sinal inconfundível de vibração espiritual interna, poderíamos ter feito algo por êle. Mas tal como era, nada podíamos fazer a não ser esperar que um dia esse ser horrível pedisse por auxílio com since­ridade.   Seu chamado seria então atendido sem falta.
Afastamo-nos e Edwin nos conduziu através de uma abertura para terreno mais ou menos nivelado.  Pudemos ver de repente que essa parte da cratera era mais densamente habitada — se é que se podia usar o termo habitantes para aquela espécie de gente.   Os habitantes estavam ocupados de diversas  maneiras: alguns sentavam-se  sobre pequenas pedras e pareciam conspirar, mas que diabólicos planos, era impossível dizer.    Outros, em pequenos grupos, infringiam inomináveis torturas aos seres mais fracos da sua espécie, que de alguma maneira lhes havia caído nas mãos.   Seus gritos eram insuportáveis, e por isso fechamos os ouvidos a eles.  Seus membros incrivelmente deformados, e em alguns casos os rostos e cabeças, haviam retrocedido a meras cari­caturas de configurações humanas.  Outros eram vistos esten­didos no solo como se exaustos de suportar torturas, ou de as infringir, antes de reunir forças para recomeçar suas barba­ridades.
Intercaladas por essa enorme área horrível, havia lagoas de uma espécie de líquido, que parecia grosso e viscoso, e incrivelmente imundo, como de fato era. Edwin nos contou que a fedentina que emanava dos charcos estava de acordo com tudo o mais aqui e aconselhou-nos a não prová-las, e seguimos o seu conselho à risca.
Ficamos horrorizados de ver sinais de vida em alguns dos charcos e adivinhamos sem êle nos contar, que freqüente­mente os habitantes escorregavam e ali caíam. Não podem se afogar porque são indestrutíveis como nós.
Testemunhamos toda espécie de bestialidades e baixezas, barbaridades e crueldades, como não podíamos suportar. Não é minha intenção nem desejo dar uma descrição detalhada do que vimos. Não tínhamos, de fato, alcançado a profun­deza do poço, mas já lhes dei suficientes pormenores do que se encontra no reino das sombras.
E agora perguntais: como acontece tudo isso? Como se permite que tais lugares existam? Talvez o assunto se es­clareça quando eu disser que cada alma que vive nesses

lugares horríveis, já viveu na terra. A idéia é horrível mas a verdade não se pode alterar. Não pensem que exagerei minha breve descrição dessas regiões, pois asseguro que não o fiz. Na verdade, nem carreguei nas tintas. Essas regiões existem em virtude das mesmas leis que governam os estados de beleza e felicidade.
A beleza do mundo espiritual é externa e visível ex­pressão do progresso espiritual e seus habitantes. Quando tivermos ganho o direito de possuir coisas belas, elas nos serão dadas através do poder criador. Assim podemos dizer que nós criamos a nós mesmos. Beleza de mente e ação, nada podem produzir a não ser beleza, e daí termos flores de beleza celestial, árvores, rios, e mares de pura e cristalina água, magníficos prédios para a alegria e gozo de todos nós, e nossos lares individuais onde nos podemos rodear com ainda mais beleza, e gozar as delícias do feliz convívio com nossos iguais.
Mas a fealdade da mente e da ação nada pode produzir a não ser fealdade. As sementes de horror semeadas no plano terrestre inevitavelmente conduzirão à colheita de horrores no mundo espiritual. Esses reinos escuros foram construídos pelas pessoas da terra, assim como elas construíram os reinos de beleza.
Nenhuma alma é forçada a entrar nos reinos escuros ou nos da beleza. Somos um grupo unido e extremamente feliz e vivemos juntos em completa harmonia. Ninguém poderia, portanto, se sentir deslocado.
Os habitantes dos reinos de escuridão, se condenaram, por suas vidas na terra, ao estado em que agora se acham. É a lei inevitável da causa e efeito, tão certo como a noite seguir-se ao dia na terra. De que adianta implorar piedade? O mundo do espírito é um mundo de estrita justiça, uma justiça com que não se pode brincar e de que todos nós nos servimos. Justiça inflexível e piedade não se podem misturar. Por mais sincera e inteiramente que possamos perdoar o mal que nos foi feito, a piedade não nos é dispen­sada no mundo espiritual. Cada má ação deve ser debitada à pessoa que a cometeu. É um assunto pessoal que deve ser resolvido sozinho, assim como a morte do corpo físico deve ser enfrentada a sós. Ninguém o pode fazer por nós, mas cada alma que habita nestas terríveis regiões escuras tem dentro de si mesma o poder de se elevar da sordidez até a luz. Precisa fazer esse esforço individual por si só; precisa trabalhar pela própria redenção. Ninguém a substitui. Cada palmo do caminho é arduamente ganho e não há piedade aguardando-a no fim, mas severa justiça.

Mas a oportunidade dourada da recuperação espiritual está pronta a esperá-la. Ela tem que mostrar sincero desejo de se adiantar uma fração de polegada na direção do reino da luz que está acima dela, e lá achará um sem-número de amigos desconhecidos, que a auxiliarão a ganhar a herança a que tem direito, mas que na sua loucura jogou fora.

Continua no próximo Bloco - VII Pessoal Espiritual


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